terça-feira, 30 de junho de 2009

Organizações pedem na Justiça suspensão de hidrelétricas do Madeira

Ao ajuizar duas ações contra as usinas, entidades alegam diversas irregularidades no processo de licenciamento das barragens de Santo Antonio e Jirau


30 de Junho de 2009 – A OSCIP Amigos da Terra - Amazônia Brasileira (SP), a Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé (RO) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira - COIAB ajuizaram na sexta-feira (26), na Justiça Federal de Rondônia, duas ações civis públicas contra as licenças de instalação das hidrelétricas Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira (RO).

As organizações alegam que há graves irregularidades no processo de licenciamento ambiental das usinas. Segundo
Roberto Smeraldi, diretor de Amigos da Terra – Amazônia Brasileira, "a concessão das licenças contrariou repetidamente os pareceres da equipe técnica do IBAMA , o que é fonte de um círculo vicioso de ilegalidade em cascata, que afeta as obras em andamento".

No caso da ação que busca a anulação da Licença de Instalação de Santo Antônio, uma das principais irregularidades apontadas é a autorização pelo Ibama da instalação da usina, antes de a Funai ter informações suficientes sobre a localização geográfica de índios isolados que vivem na área de impacto do empreendimento. Também foi destacada a falta de autorização do Congresso Nacional para o aproveitamento de recursos hídricos em terras indígenas, conforme exigido pela Constituição Federal. "É fundamental evitar o atropelo da legislação sobre os direitos indígenas para não criar um precedente perigoso a outras hidrelétricas planejadas no PAC", afirmou Marcos Apurinã da COIAB.

Além disso, a ação revela outras deficiências graves nos programas de mitigação e compensação de impactos da usina de Santo Antônio, relacionadas a populações indígenas, ribeirinhos, agricultores familiares e à população urbana de Porto Velho.

Já na ação movida contra a Licença de Instalação de Jirau, a principal irregularidade é a persistência de incertezas sobre a área do reservatório da usina, o que deveria ter sido resolvida na fase de elaboração do Estudo de Impacto Ambiental (EIA). O problema envolve a falta de análise efetiva dos riscos de assoreamento dos reservatórios no Rio Madeira. “O consórcio ENERSUS, responsável pela obra, alterou a localização da usina em
9,2 km fato que implicaria em novo Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto Ambiental, o que não ocorreu”, relata Telma Monteiro, coordenadora de Energia da Kanindé.

Réus
As ações citam como réus a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), Agência Nacional de Águas (ANA), o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e os consórcios responsáveis pelas obras de Santo Antonio e Jirau, Santo Antônio Energia S.A. (SAESA) e Energia Sustentável do Brasil (ENERSUS), respectivamente. As autoras das ações pedem a declaração de nulidade das licenças de instalação concedidas pelo Ibama entre 2008 e 2009.

Usinas - As hidrelétricas de Santo Antonio, leiloada em 2007, e Jirau, cujo leilão ocorreu em 2008, são cotadas pela ministra da Casa Civil Dilma Rousseff entre as obras mais importantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Juntas, têm a previsão de gerar de 6,3 mil megawatts de energia, principalmente para grandes indústrias no Centro-Sul. No entanto, as barragens têm sido objeto de várias ações por parte de organizações da sociedade civil e do Ministério Público, que questionam ilegalidades nos processos de licenciamento ambiental e de outorga de direito de uso de recursos hídricos do Rio Madeira.

Os graves riscos das barragens do Madeira, especialmente no caso da hidrelétrica do Jirau, sobre o território boliviano já se tornaram objeto de crise diplomática entre os dois países. Uma série de perguntas levantadas por autoridades e organizações civis da Bolivia sobre impactos dos empreendimentos em seu país continua sem respostas do Governo Brasileiro.


Mais informações:

Amigos da Terra – Amazônia Brasileira
Contatos: Roberto Smeraldi, Brent Millikan
Telefone: (11) 3887-9369
e-mail: brent.millikan@amazonia.org.br

Associação de Defesa Etnoambiental – Kanindé
Contato: Telma Monteiro
Telefone: (11) 4683 2157
e-mail: telmadm@uol.com.br

Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab)
Contatos: Marcos Apurinã, Jecinaldo Sateré
Telefone: (92) 3621-7501
e-mail: secretaria@coiab.com.br, marcosapurin@gmail

quarta-feira, 24 de junho de 2009

O novo modelo para licenciamento de hidrelétricas proposto por Minc

Entrevista: agilizar licenciamento ambiental é inconstitucional, afirma Telma Monteiro - 22/06/2009

Local: São Paulo - SP
Fonte: Amazonia.org.br
Link: http://www.amazonia.org.br


Flávio Bonanome

Durante uma audiência pública ocorrida na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro no dia 15 de junho, o ministro do Meio Ambiente Carlos Minc anunciou um novo programa para agilizar o processo de licenciamento ambiental. Nomeado "Destrava 2", o projeto tem o intuito de dar continuidade ao primeiro "Destrava" anunciado em julho do ano passado.

Desta vez, Minc pretende reduzir o tempo que o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) leva para avaliar um pedido de licença para um ano e dois meses. A notícia despertou grande desconfiança do setor ambientalista quanto a legitimidade e manutenção da qualidade do procedimento.

Entre os principais críticos da postura do ministro é a pesquisadora da Associação de Defesa Etno-Ambiental Kanindé, Telma Monteiro, que desde o anúncio do programa, fez críticas por meio de artigos em seu blog. Para a pesquisadora, a combater a idéia de Minc não é somente uma questão de proteção ao meio ambiente, mas também legal.

Em entrevista ao site Amazonia.org.br, Telma Monteiro pontua as razões da ilegalidade de um novo modelo de licenciamento, faz críticas à gestão de Minc e comenta a situação do modelo hidrelétrico atual. Confira a entrevista


Hidrelétrica Baixo Iguaçu tem licenciamento suspenso

O Juiz Federal, Sandro Vieira, manteve suspenso o processo de licenciamento ambiental da usina do Baixo Iguaçu. Sem dúvida alguma essa é uma importante vitória que indica que é possível confiar nas instituições democráticas do Brasil, como o MPF e a Justiça Federal, que têm produzido importantes decisões como essa.

É preciso continuar insistindo, para que prevaleça a jurisprudência dos juízes democráticos e não a dos autoritários. O movimento socioambiental paranaense representado por Terra de Direitos e Liga Ambiental iniciaram a luta judicial contra a usina do Baixo Iguaçu há quatro anos.

Os indícios de ilegalidades e improbidades praticadas pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP), pelo Ibama e pela Engevix foram levados ao conhecimento da Justiça Federal e do MPF pelas organizações não governamentais e tiveram o poder de convencer as autoridades. TM

domingo, 21 de junho de 2009

Que conta é essa?

Que conta é essa? Entrevista especial com Telma Monteiro
Enquanto o governo encontrar meios para explicar a importância da construção de hidrelétricas na Amazônia, os movimentos sociais e a sociedade civil lançam seus argumentos para mostrar que toda a energia que essas hidrelétricas irão produzir não será totalmente aproveitada pelo país.

Confira a entrevista.

Além de todas as hidrelétricas que estão sendo em processo de licitação, aprovação, estudo ou já sendo construídas no Brasil, aliás, em plena Amazônia, o Ministro de Minas e Energia anunciou recentemente que, para suprir as necessidades de energia do Brasil, outras duas hidrelétricas serão construídas na Argentina, duas na Bolívia e 18 no Peru. Que consumo energético é esse que o país tanto prevê? Essa é a principal questão que a pesquisadora Telma Monteiro levanta durante a entrevista que concedeu por telefone àIHU On-Line. “Nós temos, no Brasil, uma indústria de pás eólicas com tanta demanda que não dá conta da produção. É uma das maiores indústrias de pás eólicas do mundo e exporta para toda a Europa. Mas nós não a utilizamos”, revela.

Desde 2002, Telma Monteiro analisa os documentos relacionados aos projetos de construção de usinas hidrelétricas na Amazônia. Em seu blog, a pesquisadora publica seus estudos e notícias relacionadas sobre o assunto.

sábado, 20 de junho de 2009

Grande hidrelétrica e pequena hidrelétrica: dois grandes negócios

Por Telma Monteiro

"Empresas e governos devem consertar os estragos ainda passíveis de conserto, assumir e encaminhar para resolver os passivos sociais, econômicos e ambientais de todas as barragens já feitas" (Oswaldo Sevá, sobre as hidrelétricas).

Espero que os leitores deste blog tenham percebido a celeridade dos fatos que têm pautado o noticiário das questões ambientais. Trocas indecentes continuam sendo propostas e discutidas por Carlos Minc, governo e grandes concessionárias de energia, numa orgia de planos e interesses que surpreende aos mais conservadores.

Empresas estatais e privadas fazem contas sobre o quanto custará a próxima hidrelétrica que barrará outro rio brasileiro. A bola da semana é a Hidrelétrica Belo Monte, ou podemos chamar de ameaça da vez, não importa. Está difícil entender quanto custaria construir Belo Monte. Talvez 7 bi, conforme balanço do PAC. Cemig chutou 26 bi e CPFL Energia. 20 bi. As diferenças entre as “estimativas” estão oscilando entre 19 bi e 6 bi. Estamos falando de bilhões de Reais!

Não importam muito esses valores para as empresas, sempre as mesmas, que estão na parada. Odebrecht, Andrade Gutierrez, Suez, Tractebel, Furnas, Camargo Correa já fecharam o cerco em torno da vestal [a obra]. Dizem que se chama divisão de trecho. Hoje, para dividir trechos, elas formam holdings e empresas com o propósito específico de explorar nossos rios. Uma publicidade escandalosa, veiculada em revista, pergunta se você ainda não investiu em PCH. Tenha a sua, faltam dizer, é a grande opção de investimento futuro.

Hoje, no Brasil, há dois grandes negócios: uma grande hidrelétrica e uma pequena hidrelétrica. Nos dois casos, os consórcios ganham na construção – obra – e no resultado – energia. E a sociedade também ganha - os passivos ambientais. Carlos Minc resolveu contribuir com essa ciranda, prometendo um novo modelo de licenciamento ambiental para agilitar a concessão de licenças das hidrelétricas. Vão licenciar por bacia hidrográfica, ou seja, dependendo do tamanho da bacia, em vez de rios teremos sistemas lacustres.

Ambientalistas há muito vinham cobrando do Ministério do Meio Ambiente uma análise dos efeitos dos impactos cumulativos de projetos hidrelétricos nas bacias hidrográficas. Pois bem, o Minc pegou a idéia e a distorceu para transformar em licença da bacia [para várias hidrelétricas], um verdadeiro retrocesso no processo de licenciamento ambiental de aproveitamentos hidrelétricos pequenos ou grandes. Agora teremos que reverter esse absurdo. Não podemos mais aceitar barragens em rios já barrados ou barragens em rios ainda não barrados, se pretendemos preservar os rios brasileiros, as comunidades tradicionais e os povos indígenas, cujas vidas deles dependem.

Um professor da Unicamp, que admiro muito, sugeriu que devemos responder ao fascismo hidrelétrico expressando o valor e a relevância muito maiores dos rios brasileiros. Em contraponto ao que o setor elétrico chama de “potencial hidrelétrico”, passemos a chamar de "potencial protéico, pesqueiro"; em lugar de "potencial de navegação, usaremos “potencial de lazer, de consumo humano de água" ou de "potencial paisagístico, arqueológico, turístico" dos tantos rios e monumentos fluviais pelo país adentro.

Minc cedeu às pressões de Dilma e Lula nessa história de novo modelo de licenciamento. Aliás, a Dilma tem muita experiência em “novo modelo”. O método a ser usado para rasgar, mais uma vez, a Constituição, é a nova aposta do momento. Editar uma Medida Provisória pretextando “caráter de urgência” como justificativa poderá ser uma idéia. Lula adora usar MP numa média de três por semana. Como o licenciamento ambiental, segundo ele, tem emperrado o desenvolvimento do país, ficará fácil usar esse argumento. Outra forma seria usar as instruções normativas, discricionariedades tão à mão, atualmente, do Presidente do Ibama, Roberto Messias Franco.

Vi Messias Franco, outro dia, num jornal televisivo, sentadinho atrás do Lula, admirando o discurso inflamado do Presidente sobre não serem bandidos aqueles que desmataram, mesmo contrariando a lei. Acho que Messias Franco respirou aliviado, pois o Ibama não precisará mais fazer operações de fiscalização, uma vez que desmatar não é mais crime, aos olhos do Presidente da República. ™


domingo, 14 de junho de 2009

Troca Indecente


Por Brent Millikan[1] e Telma Monteiro.

O Termo de Acordo assinado pelo Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, pelo Governador de Rondônia, Ivo Cassol e pelo Presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO), Rômulo Fernandes Mello, em 02 de junho de 2009, é fruto de uma proposta do Governador de Rondônia, aceita pelo Governo Federal com aval do Presidente Lula, para viabilizar a concessão da Licença de Instalação da UHE de Jirau, por sua vez caracterizada por sérias violações da legislação ambiental brasileira. Os comentários que seguem se limitam à análise das alterações na Floresta Nacional Bom Futuro e UCs estaduais previstas no referido Termo de Acordo, sem, contudo, abordar outras irregularidades no processo de licenciamento da usina de Jirau.

Inicialmente, cabe alertar que esse Termo de Acordo demonstra os efeitos nefastos de uma recorrente lacuna na legislação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) - Lei 9.985/2000 - sobre critérios para justificar a alteração ou supressão de unidades de conservação e procedimentos afins. O arcabouço legal do SNUC deveria contemplar critérios que blindassem contra investidas privadas de redução e supressão de UCs com objetivos escusos e pouco transparentes. Seria necessário considerar previamente os impactos negativos decorrentes dessas investidas (inclusive riscos de criação de um precedente para estimular novas invasões de áreas protegidas) e assegurar mecanismos efetivos de compensação e fortalecimento da gestão de áreas potencialmente afetadas. As inúmeras tentativas que resultaram na redução e supressão de UCs estaduais em Rondônia, desde meados dos anos 90, assim como outras mais recentes para reduzir a Reserva Extrativista (RESEX) Rio Ouro Preto e a FLONA Bom Futuro, por membros da bancada rondoniense no Congresso Nacional, são exemplos dos riscos dessa lacuna na atual legislação. Ler mais...

Na análise das tentativas de impedir a completa destruição da FLONA Bom Futuro, é necessário questionar os motivos do não cumprimento, pelo INCRA, IBAMA e Governo de Rondônia, do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) de maio de 2005, que resultou da Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) e Ministério Público Estadual de Rondônia (MPE) em maio de 2004, objeto de decisão judicial em agosto de 2004. Foram desconsideradas, nesse novo acordo, as determinações do TAC para solucionar os conflitos na FLONA, como a retirada de grandes pecuaristas, especuladores e madeireiros ilegais; o reassentamento de clientes da reforma agrária ou a implantação da FLONA com plano de manejo e recuperação de áreas degradadas. Por quê?

Antes de assinar o Termo de Acordo, o Ministro Minc fez declarações contraditórias sobre a estratégia do MMA para a FLONA Bom Futuro dizendo, ora que iria retirar os pecuaristas/grileiros e reassentar as famílias passíveis de serem clientes da reforma agrária, ora que iria retirar apenas o gado dos maiores pecuaristas. Segundo declaração do Governador Ivo Cassol, apos a assinatura do Termo de Acordo “nenhuma cabeça de gado será retirada da FLONA Bom Futuro”. Considerando que já está amplamente comprovada a existência de poderosos interesses (grileiros, madeireiros, especuladores, politico-eleitorais) que operam dentro da FLONA, caberia verificar até que ponto as alterações propostas no Termo de Acordo visam atender aos interesses privados ou ao interesse público.

Na medida em que o padrão atual de ocupação ilegal da área da FLONA Bom Futuro tende a permanecer inalterado, quais são as perspectivas reais de implantação de uma APA Estadual, uma nova Floresta Estadual e nova UC de proteção integral de modo a impedir novos desmatamentos? Tudo indica que a "solução" definida no Termo de Acordo vai permitir a continuidade do desmatamento, da exploração madeireira e de outras atividades que comprometem a integridade dos atributos que justificaram a criação da FLONA, contrariando o artigo 225 da Constituição Federal de 1988.

Nesse sentido, a proposta de transformação de 70 mil hectares da FLONA Bom Futuro em Área de Proteção Ambiental (APA) fere o artigo 225, § 1°, inciso III da Constituição Federal de 1988, que incumbe ao Poder Publico “definir, em todas as Unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção"[2]. A figura de APA (artigo 15, lei do SNUC) permite a titulação de propriedades privadas e a utilização intensiva dos recursos naturais que são incompatíveis com a manutenção da cobertura florestal, requisito fundamental para a criação da FLONA. A história tem demonstrado que a proteção ambiental de APAs tem sido praticamente nula (veja-se, inclusive, o caso da APA do Rio Madeira, ao lado da Hidrelétrica Santo Antônio).

Algumas características do histórico e a situação atual das unidades de conservação "oferecidas" pelo Governador Ivo Cassol, em troca da "liberação" da FLONA Bom Futuro, em particular as Florestas Estaduais de Rendimento Sustentado (FERS) Rio Vermelho "A" e "B", devem ser consideradas:

    1. A Floresta Estadual Rio Vermelho “A” (área a ser parcialmente inundada pela usina de Jirau em sua nova localização na Ilha do Padre) foi criada por decreto estadual em 1990 com 38,68 mil hectares. Nunca foi demarcada ou beneficiada com plano de manejo pelo Governo de Rondônia e apenas uma parte foi incorporada à Estação Ecológica Serra dos Três Irmãos.
    2. A Floresta Estadual Rio Vermelho “B”, na área de influência, também, da usina de Jirau, na Ilha do Padre, foi criada com 152 mil hectares em 1990, com a previsão de contar com um projeto piloto de manejo florestal no âmbito do PLANAFLORO. Apenas 31,57 mil hectares (21%) foram demarcados em 1995, com recursos do Banco Mundial. Uma parte da área remanescente (18,28 mil hectares) foi eventualmente incluída na Estação Ecológica Mujica Nava em 1996. Grande parte da área dessa floresta estadual foi transformada pela em zonas agropecuárias.[3]
    3. O abandono, a supressão e redução das Florestas Estaduais Rio Vermelho A e B - tendência que se repetiu com diversas outras UCs estaduais - foram um reflexo, na tomada de decisões por parte do Executivo e Assembléia Legislativa do Estado de Rondônia, da prevalência de interesses imediatistas de especuladores de terras, pecuaristas, e madeireiros ilegais.
    4. As terras públicas onde foram criadas as florestas estaduais do Rio Vermelho pertencem ainda à União e nunca foram repassadas ao Governo de Rondônia. Ou seja, o Governador Ivo Cassol negociou um patrimônio que não pertence ao Estado de Rondônia.
    5. As duas Florestas Estaduais (Rio Vermelho A e B) não aparecem na ultima versão do mapa de florestas públicas do Serviço Florestal Brasileiro (SFB) e tampouco em mapa recente do MMA sobre áreas protegidas em Rondônia, o que sugere que o próprio Governo Federal desconhece a existência dessas áreas.

Mesmo que essas florestas existissem como unidades de conservação, de direito e de fato, o que não é o caso, em que medida elas iriam compensar a redução ou supressão da FLONA Bom Futuro? Qual seria o ganho, nessa troca, para a conservação?

Os signatários do Termo de Acordo de 02 de junho de 2009 parecem ignorar outro acordo entre o Ministério de Meio Ambiente (MMA) e o Estado de Rondônia, assinado exatamente cinco anos antes, em 02 de junho de 2004. Trata-se de "Acordo de Cooperação" para "adequação do zoneamento socio-econômico-ecológico de Rondônia", respaldado pela Recomendação N° 03 de 2006 do CONAMA e pelo Decreto Presidencial N° 5875 de 2006 que incluiu como uma das obrigações a de "....
proceder a desintrusão das unidades de conservação estaduais, quando da ocorrência de invasões" (cláusula segunda, item I). Essa e outras obrigações assumidas pelo Governo de Rondônia nunca foram cumpridas.

Os antecedentes de redução, supressão e degradação ambiental das Florestas Estaduais do Rio Vermelho A e B, envolvendo o não cumprimento de acordos entre o Governo de Rondônia e o Governo Federal, foram desconsiderados na elaboração do novo Termo de Acordo (Indecente). A assinatura pelo MMA/ICMBio de um termo de acordo que envolve essas florestas estaduais, comprovadamente irregulares, foi nada mais que um artifício para viabilizar um escambo de ilegalidades do Governador Ivo Cassol e seus aliados no Estado de Rondônia, oportunamente aproveitado na aprovação política da Licença de Instalação para Jirau, contrariando o parecer da equipe técnica do IBAMA.
Leia também: O Fim da Floresta




[1] Assessor Técnico da OSCIP Amigos da Terra – Amazônia Brasileira

[2] O texto do Termo de acordo não especifica quais seriam os "atos normativos" ou "instrumentos legais" a serem utilizados para efetuar a desafetação da FLONA Bom Futuro e UCs estaduais. O nosso entendimento é que uma possível tentativa de redução ou supressão por meio de Medida Provisória (e não projeto de lei) seria conflitante com o artigo 225 da CF/88 e o artigo 22, § 7° da Lei do SNUC, que estabelece que “a desafetação ou redução dos limites de uma unidade de conservação só pode ser feita mediante lei específica

[3] Segundo as diretrizes da lei da segunda aproximação do zoneamento, as áreas de zona 2 são indicadas para criação de novas UCs, o que implica que o Governo de Rondônia não reconhecia mais a existência destas áreas protegidas na época. Se tivesse reconhecido, teriam sido classificadas como zona 3, que abrange as diferentes categorias de áreas protegidas (vide Lei Estadual 233/00). As Zonas 1 e 2 são de uso intensivo para fins agropecuários, o que contrasta frontalmente com conceito de área protegida. Cabe observar que a Lei Complementar no. (233 de 03 de junho de 2000) antecedeu a lei do SNUC (Lei No 9.985 de 18 de julho de 2000) em pouco mais de um mês, o que pode dificultar questionamentos baseados no artigo 22, § 7° ( “a desafetação ou redução dos limites de uma unidade de conservação só pode ser feita mediante lei específica”) sobre a admissibilidade de lei estadual de zoneamento para reduzir ou suprimir uma UC, sem lei especifica.


sábado, 13 de junho de 2009

O ouro escondido de Santo Antônio

Assista à retirada do ouro nas obras da Hidrelétrica Santo Antônio, no rio Madeira. O vídeo foi publicado pelo site RONDONIAOVIVO


sexta-feira, 12 de junho de 2009

PROCURADORES DA REPÚBLICA NA AMAZÔNIA PEDEM PARA LULA VETAR A MP 458

Documento assinado por 37 procuradores que atuam na região alerta para graves consequências jurídicas e sociais da MP.

Procuradores da República que atuam na região Amazônica enviaram hoje um ofício ao presidente Lula alertando para “problemas jurídicos e conflitos sociais que podem ser agravados em caso de sanção integral do texto” da Medida Provisória nº 458/2009, aprovada no último dia 03 de junho pelo Congresso Nacional. Os 37 signatários do documento se dizem “irresignados com o formato assumido pela MP” e atacam: “o tratamento dado à questão fundiária na Amazônia pelo referido diploma legal beira a insensatez” e “representa na prática mais um incentivo à invasão e ao desmatamento de novas áreas”.

Obrigados por determinação constitucional a defender os direitos de clientes da reforma agrária, ribeirinhos, índios e quilombolas e cumprindo tal obrigação na parte do Brasil que mais registra conflitos fundiários, os procuradores alertam para o fortalecimento dos grileiros que ameaçam os territórios das populações tradicionais, se o presidente confirmar na íntegra o texto aprovado pelo Senado. Os procuradores – atuando no Pará, Amapá, Acre, Rondônia, Mato Grosso, Tocantins e Roraima – consideram as falhas da MP insanáveis e afirmam que são “uma ameaça aos 20 anos de trabalho do Ministério Público Federal na defesa da dignidade e dos direitos dos povos da região”.

No texto endereçado a Lula é citado o exemplo das terras pelas quais foi assassinada a missionária Dorothy Stang, em Anapu. A área, de 1.500 hectares – exatamente o limite dos lotes que, pela MP, podem ser concedidos gratuitamente a ocupantes ilegais – foi disputada durante anos, até a morte da freira. Consumado o crime, como não havia nenhum dispositivo legal para favorecer os grileiros, a área foi transformada em um assentamento de trabalhadores rurais. Para os procuradores, se a MP 458 já estivesse em vigor na época, os acusados pela morte de Dorothy teriam saído vitoriosos.

Veja abaixo os nomes dos signatários do ofício ao presidente Lula

1. Alan Rogério Mansur Silva

2. Álvaro Lotufo Manzano

3. Ana Carolina Oliveira Tannus Diniz

4. Ana Karízia Távora Teixeira

5. Ana Paula Fonseca de Góes Araújo

6. Analícia Ortega Hartz Trindade

7. André Casagrande Raupp

8. André Sampaio Viana

9. Anselmo Henrique Cordeiro Lopes

10. Antônio Carlos Marques Cardoso,

11. Bruno Araújo Soares Valente

12. Claytton Ricardo de Jesus

13. Damaris Rossi Baggio de Alencar

14. Daniel César Azeredo Avelino

15. Daniela Caselani Sitta

16. Ercias Rodrigues de Sousa

17. Felício de Araújo Pontes Júnior

18. George Neves Lodder

19. Gustavo Nogami

20. Heitor Alves Soares

21. Heitor Soares

22. Igor Nery Figueiredo

23. João Gabriel Morais de Queiroz

24. José Augusto Torres Potiguar

25. José Cardoso Lopes

26. Laura Gonçalves Tessler

27. Marcel Brugnera Mesquita

28. Marcia Brandão Zollinger

29. Mário Lúcio Avelar

30. Raquel Teixeira Maciel Rodrigues

31. Reginaldo Pereira da Trindade

32. Ricardo Gralha Massia

33. Rodrigo Golivio Pereira

34. Rodrigo Luiz Bernardo Santos

35. Rodrigo Timoteo da Costa e Silva

36. Ubiratan Cazetta

37. Vanessa Cristhina Marconi Zago Ribeiro Scarmagnani

Fonte: MPF - Ministério Público Federal
Link: http://www.mpf.gov.br

www.amazonia.org.br

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Grandes hidrelétricas estão sendo construídas por empresas brasileiras em rios africanos


A sedução pelo crescimento econômico acelerado está destruindo todo um patrimônio de riquezas naturais em Angola, país de língua portuguesa, fragilizado por uma guerra civil que durou dezoito anos.
A Hidrelétrica Capanda foi construída no Kwanza, o principal rio de Angola e entrou em operação em 2006. A formação do reservatório engoliu 172 quilômetros quadrados de florestas nativas e afetou uma área com mais de 152 mil quilômetros quadrados da bacia hidrográfica do Kwanza, a mais extensa de Angola e detentora de uma das mais ricas biodiversidades do planeta.
Os autores dessa façanha? A empresa estatal brasileira Furnas Centrais Elétricas e a Construtora Norberto Odebrecht, com recursos do BNDES. É o mesmo grupo que está construindo a mega obra no rio Madeira, a usina de Santo Antônio e que, também, foi responsável pelo desastre de uma hidrelétrica no Equador. Tanto em Angola como no Equador Furnas realizou a fiscalização técnica e contratual e prestação de serviços de consultoria e assessoria. Ler mais...
Os investimentos para a construção de Capanda passaram dos 3 bilhões de dólares dos quais o BNDES contribuiu com 1,13 bilhão de dólares. A potência instalada de Capanda é de apenas 520 Mw, e há projetos e estudos técnicos de outros sete aproveitamentos hidrelétricos ao longo do rio Kwanza para gerar mais 2 100 Mw.
Por outro lado, apenas 15% da população de Angola têm água potável canalizada. A capital, Luanda, não tem coleta de lixo e o saneamento básico praticamente não existe. Como o Brasil, em especial o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Angola também privilegia grandes obras sem avaliação prévia das necessidades da sociedade, alimentando a desigualdade com práticas ambientalmente danosas.
Atualmente Luanda é palco de um desenvolvimento anacrônico onde estão sendo construídos, com mão de obra semi-escrava chinesa, grandes edifícios e condomínios de luxo para abrigar altos funcionários e burocratas das empresas que vão explorar os setores de energia e telecomunicações. Enquanto isso, aumentam a miséria urbana e as doenças infecto-contagiosas decorrentes do desequilíbrio imposto pelo ataque indiscriminado aos recursos naturais.
Para construir Capanda foi preciso, além da cumplicidade das empresas brasileiras com o governo de Angola, destruir obstáculos praticamente intransponíveis como as florestas de Baobás - árvores de 30 metros de altura com capacidade de armazenar, em seu caule gigante, até 120.000 litros de água e que são denominadas, também, "árvores-garrafa”, desalojar famílias sem a devida indenização, canalizar e mudar cursos d’água causando a destruição do hábitat e a extinção de peixes nativos. Tudo isso sob as vistas de um estado que não exige estudos ambientais compatíveis, que não escuta a sociedade, e que não adota medidas mitigadoras ou critérios para a remoção e reassentamento das comunidades tradicionais afetadas pelo empreendimento.
Em depoimento, uma moradora removida da área impactada pela usina de Capanda afirmou estar “feliz” com a nova moradia, pois a água das enchentes só chegava, agora, até a cozinha e não atingia mais as camas da família. Esse é o cenário que ilustra a dimensão do que se passa em Angola, sob o patrocínio de empresas brasileiras estatais e privadas.
Continuando o projeto de construir grandes barragens na África, Furnas e Odebrecht assinaram no ano passado, 2008, mais um contrato para a realização dos estudos de viabilidade da futura Hidrelétrica Baynes, no rio Cunene na fronteira de Angola com a Namíbia. Além das duas empresas, integram ainda o consórcio Cunene, a Eletrobrás e a Engevix, outra grande empreiteira que será responsável pela “interface” entre os estudos de engenharia e os estudos socioambientais. A implantação do empreendimento dependerá apenas da aprovação do Estudo de Viabilidade da Hidrelétrica Baynes e da licitação a ser feita pelos governos de Angola e Namíbia, sem processo de licenciamento ambiental.
Paralelamente, a Odebrecht, em parceria com angolanos, começou a plantar 30 mil hectares de cana-de-açúcar em terras na província de Malanje, nas margens do lago da Hidrelétrica Capanda, já devidamente despojadas da floresta de Baobás e com infinita disponibilidade de água para irrigação. O projeto pretende produzir anualmente 250 milhões de toneladas de açúcar, 50 mil metros cúbicos de etanol e gerar 140 megawatts com a queima dos resíduos da produção.
A cana-de-açúcar é apenas mais um negócio da empreiteira na escalada da exploração e destruição dos recursos naturais na África, que se soma às minas de diamantes e construção de barragens. Os detalhes finais para outras duas hidrelétricas com capacidade de geração de mais 5 mil megawatts, já estão sendo finalizados entre a Odebrecht e o governo angolano.
Os consórcios brasileiros formados por grandes empreiteiras e empresas estatais estão repetindo na África as estratégias de negócios praticadas no Brasil e nos países da América do Sul como Peru, Bolívia e Equador. Essas estratégias estão calcadas em um modelo de desenvolvimento ambientalmente agressivo e consumidor dos recursos naturais. Ao criar negócios exclusivamente para acumulação de riquezas por poucos à custa da privatização dos recursos naturais, se produzirá mais desigualdade social através da degradação ambiental. (TM)

Investigação mostra passivos de hidrelétricas em rios do continente africano

Um dos artigos mais primorosos sobre as mentiras contadas para justificar as boas intenções da construção de hidrelétricas foi publicado na edição de junho da revista britânica Ecologist. Não falava do Brasil, mas da destruição dos rios africanos. O jornalista investigativo Khadija Sharife conta que a geração de eletricidade de Moçambique, por exemplo, é suficiente para abastecer o país inteiro, mas paradoxalmente só 9% da população usufruem da energia. A África já tem 1.270 usinas e quase todas servem diretamente a indústrias multinacionais, fornecem água para mineradoras e irrigação para grandes latifúndios. Cerca de 400 mil pessoas já foram desapropriadas por causa das hidrelétricas e seu acesso à energia continua marginalizado, sem falar nos prejuízos ao acesso aos cursos d’água, que passam a fluir cada vez menos, no continente mais castigado por secas no planeta. Qualquer semelhança não é mera coincidência. Fonte AmbienteJá

(O Eco, 08/06/2009)

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Ibama concede licença de instalação para Hidrelétrica de Jirau

03/06/2009 | 21h35 | Rondônia

O presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Roberto Messias, assinou na noite de hoje (3) a licença de instalação para a Usina Hidrelétrica de Jirau, no Rio Madeira, em Rondônia.

De acordo com o Ibama, a licença tem 54 condicionantes que deverão ser cumpridas pela Energia Sustentável do Brasil (ESBR), responsável pelo empreendimento. Entre as condicionantes, estão exigências ambientais e socioeconômicas. A licença de instalação da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, também no Rio Madeira, listava 40 condicionantes.

A concessão da licença de instalação para Jirau só foi possível após acordos assinados pelo consórcio com a prefeitura de Porto Velho e com o governo de Rondônia para definir as compensações que serão repassadas pela empresa para amortecer os impactos sociais da obra na região. O município receberá R$ 69 milhões e o estado R$90 milhões.

Com a licença, a ESBR pode retomar as obras de Jirau, paralisadas desde o último dia 19, quando venceu a licença parcial concedida pelo Ibama para a instalação do canteiro de obras e a construção das ensecadeiras.

A licença de instalação é a segunda etapa do processo de licenciamento ambiental. A etapa seguinte é a licença de operação, concedida quando a obra estiver concluída. Jirau terá uma potência de 3,3 mil megawats (MW) e uma energia assegurada de 1,9 mil MW médios, suficientes para abastecer quase 10 milhões de casas. O custo total da obra está orçado em R$ 9 bilhões.

Da Agência Brasil

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Técnicos do IBAMA apontam sérios riscos no projeto de Jirau - Parte I

Telma Monteiro

O IBAMA tornou público no dia 25 de maio o Parecer Técnico Nº 039/2009 que analisou as informações constantes do Projeto Básico Ambiental (PBA) da Usina Hidrelétrica de Jirau apresentado pela Energia Sustentável do Brasil – ESBR, incluindo a avaliação do cumprimento das condicionantes específicas contidas na Licença Prévia n° 251/2007. O parecer conclusivo da equipe técnica, em face de todas as pendências destacadas, é contrário à emissão Licença de Instalação.

As várias pendências apresentadas e analisadas ao longo do documento de 127 páginas, desta vez, estão evidentes no texto do parecer técnico e dão a dimensão exata sobre as incertezas ambientais que cercam ainda o projeto das usinas do Madeira, cujas obras estão em andamento. Entre elas estão condicionantes da Licença Prévia não atendidas, falta de respostas às questões não esclarecidas no EIA e que vêm sendo postergadas para as próximas fases do processo de licenciamento.

Sedimentos e troncos flutuantes ameaçariam a barragem

Já em fevereiro de 2009, a equipe do IBAMA alertou para o fato de que até aquele momento não havia menção, nos estudos, a dispositivos de proteção contra troncos flutuantes ou à construção de um modelo reduzido; questões essas não elucidadas e cujas respostas são imprescindíveis para a emissão da LI integral de Jirau. Leia mais...

Os estudos em modelo reduzido são necessários para desenvolver projetos e analisar os possíveis impactos que poderiam ocorrer nas fases de construção e operação de usinas hidrelétricas. Somente um modelo hidráulico corretamente projetado pode permitir determinar com certeza o fluxo de transporte de sedimento e os níveis de assoreamento. O comportamento da vazão do rio Madeira com o barramento tem que ser simulado em modelo hidráulico reduzido, pois se trata de um dos três maiores rios do mundo em transporte de sedimentos.

Avaliar os sedimentos no fundo do reservatório a fio d’água de Jirau, antes da construção da barragem, é de suma importância, pois pode mostrar que o assoreamento – resultado da deposição de sedimentos – afetaria a região a montante que, nesse caso, inclui terras bolivianas. Pode servir de base para concluir que hidrelétricas construídas em rios na Amazônia devem ter vida útil muito curta e causar impactos regionais irreversíveis.

O Brasil não detém a tecnologia para construção de um modelo hidráulico reduzido que possa reproduzir as condições específicas dos fluxos físicos e bióticos no rio Madeira que afetarão a barragem de Jirau. A usina de Jirau é objeto de análise dos estudos ambientais desde 2004 pelo IBAMA e já obteve uma licença parcial de instalação, mas está sendo construída no escuro.

Os técnicos do IBAMA apontam que não foi apresentado nenhum estudo adequado para monitoramento do transporte de sedimentos e da evolução do assoreamento do reservatório. O Parecer Técnico descreve que em março de 2009 representantes da Sedam, da Aneel, do IBAMA, da ESBR e acadêmicos ficaram uma semana em Grenoble, França, no Laboratório de Hidráulica Sogreah, especializado no know how de transporte de sedimentos, para tentar absorver a tecnologia de construção de um modelo hidráulico reduzido. Essa visita técnica deveria nivelar conhecimentos sobre questões específicas dos aspectos ambientais, de segurança e de eficiência das turbinas bulbo a serem instaladas na UHE Jirau, no rio Madeira.

Essa visita ao laboratório francês deixa claro que as questões levantadas pela equipe do IBAMA e por especialistas com relação ao assoreamento do reservatório e aos troncos flutuantes e semi-submersos à deriva não encontravam respostas no Brasil. São dúvidas pendentes desde os estudos ambientais que precederam a licença prévia, constando inclusive das condicionantes.

Para que se tenha uma idéia da importância dessas incertezas, o Parecer Técnico do IBAMA transcreve parte de um documento enviado por Furnas ao MP de Rondônia em resposta ao relatório que analisou o EIA da usinas. Nele há uma estimativa preliminar sobre a presença de 20.000 troncos de árvores transportados mensalmente pelo rio Madeira na região dos estudos, durante a época de cheias. Em média cada tronco deve pesar 1 000 quilogramas por metro cúbico o que pode significar 6 700 toneladas por dia. Foram estimados 35 mil troncos flutuantes com mais de 3 metros passando por Porto Velho em 24 horas e ainda não foi apresentada nenhuma solução que demonstre como esses detritos serão interceptados antes de atingir as estruturas da barragem depois de construída.

“Seria preciso montar um mecanismo altamente eficiente ainda não conhecido ou uma verdadeira operação de guerra onde seria necessário retirar uma tora de madeira a cada 2 minutos durante toda a época de cheias, 24 horas por dia.”

Os técnicos afirmam que o manejo desse volume de detritos “constitui um transtorno operacional e até mesmo um risco a segurança da barragem” e “requer prioritariamente a definição pela engenharia responsável pelo projeto de mecanismos que permitam a gestão deste material”. Segundo eles, ainda, é preciso que o modelo contemple ensaio completo dos sedimentos e ensaio com troncos e materiais flutuantes e submersos considerando uma vazão de cheia como a máxima observada em Porto Velho.

O modelo hidráulico, nesse caso, cuja tecnologia o Brasil ainda não tem, poderia trazer informações fundamentais que inviabilizariam a construção de Jirau, tanto no que se refere aos sedimentos no reservatório quanto aos riscos à segurança da barragem e a jusante. A condicionante que fala da necessidade do detalhamento que demonstre a capacidade de mitigação e compensação de impactos exige conhecer o comportamento dos sedimentos nas turbinas e vertedouros, o que não é possível sem o modelo hidráulico.


Ferrogrão – soja no coração da Amazônia

Estudo Preliminar 3 - Ferrogrão e a Soja na Amazônia                                                        Imagem: Brasil de Fato   ...