quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Belo Monte: Previ foge de responsabilidade socioambiental

Disposta a financiar Belo Monte, Previ foge de responsabilidade socioambiental

Fonte: EIA/RIMA de Belo Monte
Publicado em 21 de outubro de 2010 
Por Xingu Vivo
Em 7 de julho deste ano, o Movimento Xingu Vivo para Sempre enviou à Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, uma notificação extrajudicial alertando para a possibilidade de inclusão da entidade no grupo de corresponsáveis por qualquer dano ambiental e social que poderá ocorrer em função da  construção de Belo Monte.
A notificação se baseia no fato de que, ao financiar um projeto que apresenta graves falhas nos estudos de impacto ambiental e social, oficialmente reconhecidas e amplamente divulgadas, o agente financiador assume para si os riscos e  se torna corresponsável pelos danos causados pela obra (documentos similares foram ou estão sendo enviados para todos os agentes financiadores que ja declararam intenção de financiar a usina).
Entre os pontos sensíveis, a notificação aponta, por exemplo que “em 01.02.2010, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA concedeu a Licença Prévia (LP) ao empreendimento (LP no 342/2010), mesmo contrariando pareceres da equipe responsável pela análise de sua viabilidade ambiental recomendando a sua não emissão, porque não foi possível atestar a viabilidade ambiental. Essa conduta não só infringiu os princípios da moralidade e da motivação dos atos e decisões administrativas (art.37, caput, CF; art. 2o, Lei Federal 9784/99), sendo, portanto, de duvidosa validade jurídica, como também criou um imenso risco ao investimento, pois de forma irresponsável desconsiderou problemas de grande magnitude que já deveriam ter sido resolvidos, e que podem afetar não só a viabilidade econômica do empreendimento mas, sobretudo, sua possibilidade de implantação.
Com efeito, na Nota Técnica 04/2010, assinada dois dias antes da emissão da licença, a equipe técnica do IBAMA afirma, expressa e inequivocamente, que “não há elementos suficientes para atestar a viabilidade ambiental do empreendimento, até que sejam equacionadas as pendências apontadas nas conclusões do Parecer 06/2010”. E não são pendências sobre aspectos secundários do empreendimento ou de seus impactos, mas sobre aspectos centrais”.
Segundo Roland Widmer, analista de Ecofinanças da ONG Amigos da Terra – Amazônia Brasileira, a notificação simplesmente informa que, pela lei brasileira, mesmo quem não faz parte do consórcio, mas financia a obra, tem responsabilidade. “O objetivo principal das notificações é fazer com que os bancos e fundos estejam cientes de suas responsabilidades ao assumirem um eventual financiamento. Com base nisso, eles podem decidir se abster do financiamento  ou assumir o risco financeiro e de reputação. O que eles não podem fazer é alegar num futuro processo na justiça que eles não estavam cientes das suas responsabilidades”.
No início deste mê, a Previ enviou uma resposta à coordenação do Movimento Xingu Vivo para Sempre, onde se abstém de comentar o mérito do documento, mas tenta se defender antecipadamente de problemas que a atingirão como possivel corresponsável pelos impactos da usina.
Veja abaixo a íntegra da nota:
Rio de Janeiro, 01 de outubro de 2010
Ao Movimento de Mulheres do Campo e Cidade – PA
Ref.: Notificação Extrajudicial – Usina de Belo Monte
Em atenção à notificação encaminhada por vossa senhoria no dia 26 de junho de 2010, informamos que a Previ é Entidade Fechada de Previdência Complementar (EFPC), pessoa jurídica distinta de empersas que formam o Consórcio para o AHE Belo MOnte, não sendo possível responsabilizá-la por questões desse empreendimento.
Em que pese reconhecer a importância da questão ambiental e das demais considerações traxidas por V. Sas, a Previ desde já refuta as alegações apresentadas que de alguma forma tentam vincular esta EFPC a fatos e atos cujas responsabilidades não lhe são inerentes.
Atenciosamente,
Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil
Marco Geovanne Tobias da Silva, Diretor de Participações

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Belo monte de violências (V)

Imagem: info.abril.com.br

Artigos de Felício Pontes Jr., procurador da República no Pará e mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC-Rio.

Organizada em nove textos, a série de artigos está sendo publicada semanalmente pelo Diário do Pará aos domingos, no caderno Brasil.
Desde a década de 90, tudo que os indígenas do Xingu solicitavam era falar com o presidente da República sobre Belo Monte. Uma das tentativas de suas entidades foi promover o II Encontro dos Povos Indígenas do Xingu, na cidade de Altamira/PA, em maio de 2008. A população local se preparou para receber os indígenas. No ginásio que sediou o evento milhares de pessoas lotavam as arquibancadas. Os indígenas entoavam cantos e gritos de guerra como se desejassem que sua voz ecoasse Xingu a fora.
Altamira possui o movimento social mais atuante da Amazônia. Os colonos que chegaram com a abertura da 

Transamazônica, e conseguiram sobreviver à propaganda enganosa da ditadura militar, se juntaram aos povos tradicionais, indígenas e ribeirinhos, somando forças contra principalmente fazendeiros e madeireiros, normalmente financiados pela Sudam e pelo Banco da Amazônia. Esse contraste fez a região produzir vários líderes importantes como Ademir Federicci (o Dema), Bartolomeu Silva (o Brasília), e Irmã Dorothy. Todos foram mortos no embate contra um modelo insustentável de desenvolvimento. Conheci todos eles.

Os principais personagens que apoiavam a luta dos indígenas estavam presentes no Encontro. O bispo do Xingu, D. Erwin Krautler, recentemente vencedor do “Nobel Alternativo” de 2010, fez um discurso emocionante, profetizando o que chamou de genocídio. Antônia Melo, do Movimento Xingu Vivo para Sempre, chamou a atenção para os efeitos negativos sobre a biodiversidade e a população de Altamira “quando o rio se tornar um lago”. Oswaldo Sevá, da Unicamp, demonstrou catedraticamente a inviabilidade econômica da usina. Provou que a geração de energia será mínima diante do elevadíssimo custo.

O representante do governo no encontro não era nem o presidente da Eletrobrás, nem o Ministro das Minas e Energia, nem tampouco o presidente da República, tão esperado. Enviaram um servidor da Eletrobrás, engenheiro Paulo Fernando Rezende. Falou por cerca de 50 minutos. Foi interrompido várias vezes por vaias das arquibancadas. Após uma das interrupções, diz que a barragem vai sair, queiram ou não, e que morava no Rio de Janeiro, onde não ficaria sem eletricidade.

Os indígenas apenas o ouvem, pacientemente, sentados no salão do ginásio, sem esboçar qualquer reação. Depois do discurso oficial, os Kaiapó levantam e iniciam a dança da guerra, brandindo flechas, lanças e facões. Eram mais de 600 índios e a manifestação foi contundente. Na confusão, o engenheiro teve um corte no braço. As imagens do sangue do “branco” correram o mundo.

Após o episódio, estive com os índios, ainda muito tensos, em seu acampamento. Eles se sentiram desrespeitados. Deram-se conta de que a decisão por Belo Monte já estava tomada e que não seriam ouvidos, como manda a Constituição do Brasil. Achavam que iriam discutir o empreendimento, já que esperavam por tanto tempo uma conversa com um representante do governo. Ouviram que a barragem seria construída, e se sentiram enganados. Um kaiapó benajoro (líder grande) me disse algo para não esquecer: “essa barragem mata o rio, matando o rio, mata a gente também. Então, vamos morrer lutando.”

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Belo monte de violências (IV)

Artigos de Felício Pontes Jr., procurador da República no Pará e mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC-Rio.
Organizada em nove textos, a série de artigos está sendo publicada semanalmente pelo Diário do Pará aos domingos, no caderno Brasil.

No início de 2007 um fato inusitado surpreendeu o Ministério Público Federal – MPF. Os índios da Volta Grande do Xingu avisaram que o fluxo de voadeiras subindo e descendo o rio estava acima do normal. Disseram que “brancos”, portando máquinas fotográficas, filmadoras e outros equipamentos que não souberam identificar, paravam nas margens do rio, entravam pelos igarapés e recolhiam materiais do solo e da flora, sem pedir licença.
A suspeita era de que se tratava do início do Estudo de Impacto Ambiental (Eia) de Belo Monte. Até aí a coisa era previsível, embora parecesse muito rápido o processo de licitação para escolher quem faria esse estudo. Ainda estava presente a lembrança do que aconteceu em 2000, quando a Eletronorte gastou R$ 4,8 milhões em um EIA que não serviu para nada, pois o licenciamento estava se dando no órgão ambiental do Pará, e não no Ibama, como manda a lei.

Nesse novo Estudo, foi a vez da Eletrobras inventar inovações. Seus representantes foram chamados para uma reunião com procuradores da República em fevereiro de 2007. Informaram que  a Eletrobras fez uma “parceria” com três das maiores empreiteiras do país – Camargo Corrêa, Norberto Odebrecht e Andrade Gutierrez – para confeccionar o Eia.

Trocando em miúdos, tem-se o seguinte. “Parceria” significava contratação sem licitação, através de um “Acordo de Cooperação Técnica”. Para quê? Para fazer consultoria ambiental. Quem? As empreiteiras. Mas, essa é a área de atuação das empreiteiras? Fazer estudos ambientais?

A justificação do acordo era surreal: “exiguidade do prazo para a ultimação do Eia”; e porque as empresas possuíam “reconhecida e comprovada competência na mobilização, viabilização, condução e implantação de empreendimentos desse porte”. As justificativas são falsas. Primeiro, porque não existia prazo para o Eia. Segundo, a comprovada competência das empreiteiras jamais poderia ser em consultoria ambiental.

Foram além. Colocaram no papel que a escolha dessas empreiteiras seria “para possibilitar, no menor prazo possível, a realização do empreendimento”. Portanto, já partiram do pressuposto que obra seria realizada mesmo que o Eia constatasse a sua inviabilidade ambiental, social e até mesmo econômica, já que a usina vai ficar parada por algo em torno de quatro meses no ano em virtude da período de estiagem do Xingu.

O pior ainda estava por vir. O acordo tinha cláusula de confidencialidade. Ou seja, o resultado do Eia não poderia ser divulgado até a expedição da Licença Prévia, apesar de ser um acordo público e tratar de meio ambiente, assunto para o qual a publicidade é um dogma.

Marcelo Ribeiro, um dos procuradores da República do caso, resumiu a história: “é um cenário de absoluta irregularidade. Trata-se de uma dispensa de licitação ilegal, circundada por cláusulas estapafúrdias e contrárias ao interesse público, com informações privilegiadas a determinadas empresas em detrimento de concorrentes na eventual licitação da obra.”

Depois que fizeram o Eia, aliás, essas empreiteiras mostraram total desinteresse em se associar para fazer a obra. Interessante notar que, desde a retomada do projeto no ano 2000, o discurso do governo federal era no sentido de que a obra seria realizada e financiada pela iniciativa privada. Tudo mudou. Hoje o governo anuncia que fará a obra de qualquer jeito. Até com o BNDES financiando 80%, o que será motivo para mais questionamentos se a ameaça se concretizar.

Voltando ao acordo com as empreiteiras, o MPF entrou com Ação de Improbidade Administrativa. Conseguiu parar a execução. Em seguida, a decisão foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal em Brasília, onde o caso aguarda julgamento até hoje. 

A urgência insana de Teles Pires

Imagem: ecoviagem.uol.com.br

Entrevista especial com Telma Monteiro



Telma Monteiro estava imersa nos documentos sobre Teles Pires quando atendeu a IHU On-Line para a entrevista a seguir. Sendo uma das poucas pessoas no país que está estudando, analisando e traduzindo os relatórios lançados sobre o complexo hidrelétrico que poderá ser construído entre os estados do Pará e Mato Grosso – e que desemboca direto no complexo hidrelétrico do rio Tapajós – Telma parou para nos explicar em que contexto estão se dando as negociações sobre este projeto. “Houve um aumento muito grande de consumo de energia nessa região com a instalação de indústrias. No último Plano Decenal de Energia isso fica muito claro. O consumo de energia indústria na região norte pulou de 6,3 para 8,6%. E para se resolver o problema desse consumo de energia constroem hidrelétricas”, descreve.
Telma Monteiro é coordenadora de Energia e Infraestrutura Amazônia da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Você pode nos falar um pouco sobre o contexto em que está se organizando a construção da Usina hidrelétrica de Teles Pires?
Telma Monteiro – É tão complexo. Os estudos de inventário de Teles Pires datam de 1980. Já o EIA Rima foi entregue em abril deste ano. Mas os estudos começaram e depois foram interrompidos e em 2001 foram retomados por um consórcio formado por duas empresas que finalizaram o relatório. Inicialmente, o estudo previa seis aproveitamentos do Teles Pires, sendo cinco nesse rio e um no Apiacás, que chamam de hidrelétrica Foz do Apiacás. Os aproveitamentos que foram confirmados são:

-
São Manoel, com 747 megawatts;
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Teles Pires, que é a que o Ibama acabou de dar o aceite, com 1820 megawatts;
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Colíder, com 342 megawatts;
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Sinop, com 461 megawatts;
- e
Magessi, com 53 megawatts.

Além disso, está previsto uma potência de 275 megawatts na hidrelétrica de Foz do Apiacás. Então, em 1980 tivemos a análise da bacia do Teles Pires e a retomada, em 2001, foi finalizada em 2005. Esta, aí sim, foi feita pela
Eletrobrás, Furnas e Eletronorte. Os estudos de viabilidade foram elaborados por Leme e Concremat.

A hidrelétrica de Teles Pires está situada bem na divisa dos estados do Pará e Mato Grosso. O barramento deste está bem no limite de uma sequência de cachoeiras a jusante conhecidas por
Sete Quedas. Só o sistema de transmissão que precisa ser feito para essa hidrelétrica de Teles Pires vai ter mil quilômetros para chegar ao sistema interligado nacional com 20 quilômetros de largura de corredor. A área de influência indireta da hidrelétrica de Teles Pires tem 3.149 quilômetros quadrados. Ela afeta diretamente os municípios de Paranaíta, Jacareacanga e Alta Floresta. No entanto, o EIA Rima considera Paranaíta e Jacareacanga como área de influência indireta e nesses dois municípios é onde estão terras indígenas importantíssimas. Para o documento, a área de influência direta está no entorno de 1610 quilômetros quadrados. A área alagada de Teles Pires será de 333 quilômetros quadrados para produzir 1.820 megawatts de potência instalada e 911 de energia firme. Não faz sentido se criar um impacto monstruoso nessa região para produzir tão pouca energia. Vivem nesse entorno 79 mil pessoas. A área rural é bastante grande tem 20 mil habitantes, é de difícil acesso e está cercada de vegetação nativa. Imagine o impacto quando chegarem os 40 mil trabalhadores.

O objetivo do governo com esse projeto de ‘desenvolvimento regional’ nada mais é transformar essa região numa produtora de energia – e estamos cansados de saber para onde vai toda essa energia – para indústrias que estão se instalando na região norte. Houve um aumento muito grande de consumo de energia nessa região com a instalação de indústrias. No último
Plano Decenal de Energia isso fica muito claro. O consumo de energia indústrial na região norte pulou de 6,3 para 8,6%. E para se resolver o problema desse consumo de energia constroem hidrelétricas. Na Amazônia, esses complexos hidrelétricos são considerados energia limpa e renovável, o que não é verdade. A biodiversidade que será perdida não é renovável, os ecossistemas afetados não vão se recuperar, a cultura dos povos indígenas e ribeirinhos será perdida.
IHU On-Line – Você pode falar um pouco sobre a região onde as hidrelétricas podem ser instaladas?
Telma Monteiro – Esse é o grande problema. A região onde estão projetadas todas essas hidrelétricas é limite das terras indígenas Kayiabi e Munduruku. A hidrelétrica Teles Pires está exatamente há 50 quilômetros da hidrelétrica de São Manoel que é a jusante. O rio Teles Pires se junta com o rio Juruena e os dois deságuam no que chamam de Tapajós. Imagina aquele bico do Mato Grosso que de um lado é Pará, do outro é Amazonas e embaixo é Mato Grosso. Bem ali se juntam o Teles Pires e o Juruena e, a partir dali, o Tapajós entra no Pará. Portanto, Teles Pires está há 50 quilômetros das terras dos Kayabi em direção ao Pará. Ela está localizada bem na divisa de Jacareacanga (no Pará) e Paranaíta (que está no Mato Grosso) e seu reservatório terá 70 quilômetros de comprimento. Imagina isso! é um absurdo!

Essa é uma região pouco ocupada. O maior problema virá quando for construída a de
Teles Pires porque no pico das obras haverá 40 mil empregados trabalhando. Para você conseguir chegar até onde vão fazer a hidrelétrica é preciso andar 990 quilômetros partindo de Cuiabá, e esse é o único acesso que se tem para levar todos os materiais. É uma área, portanto, de floresta e onde há a presença de duas importantes terras indígenas e que não tem acesso. Desses 990 quilômetros, 660 são pela BR 163 e o resto é tudo por vias que não existem ainda, ou seja, são de difícil acesso. Imagina a logística disso tudo. Estão fazendo um conjunto de hidrelétricas no meio do nada para onde serão levados 40 mil pessoas
IHU On-Line – E o povo da região tem conhecimento sobre essa obra?
Telma Monteiro – Não, porque o Ibama acabou de dar o aceite ao EIA Rima e, a partir disso, eles têm 45 dias para marcar as audiências públicas. O Maurício Tolmasquim já afirmou que o leilão será feito em dezembro. Isso é uma loucura!
IHU On-Line – O EIA Rima foi apresentado em abril e aprovado cinco meses depois. O que isso significa?
Telma Monteiro – A coisa transcorreu de forma muito rápida. Todos pensávamos que as usinas do Tapajós seriam as próximas a serem aprovadas e, de repente, o Ibama analisa e dá seu parecer tão rapidamente sobre um EIA Rima tão complexo e imenso. Nós não temos notícias ou documentos sobre complementações pedidas, processo que geralmente ocorre. Todos fomos pegos desprevenidos com relação ao Teles Pires, embora saibamos que esta hidrelétrica estava presente nos planos do governo. O que surpreende é a velocidade com que esse projeto foi analisado e, agora, a urgência que se tem para que seja expedida a licença prévia. Temos 45 dias para as audiências públicas e a previsão é de que o leilão seja feito em dezembro. Isso é uma insanidade.
Para ler mais:

Declaración III Encuentro mundial Contra las Represas

Imagem: argentina.indymedia.org

¡Aguas para la vida, no para la muerte! El grito hecho en el Primer Encuentro Internacional de Afectados por Represas, realizado en Curitiba, Brasil, 1997, se reafirmó en la Segunda Reunión Internacional en 2003 en Rasi Salai, Tailandia, y nuevamente recobró fuerza durante estos intensos días en Jalisco, en la comunidad de Temacapulín.
Declaración de Temaca- Aprobada en el Tercero Encuentro Internacional de Afectados por Represas y sus Aliados (Temacapulín, Jalisco, México, octubre 1 a 7, 2010)
Solidaridad con Temacapulín, Acasico y Palmarejo 



Nosotros, más de 320 personas de 54 países a lo ancho y largo del mundo, afectados y luchadores contra las represas destructivas y activistas por el uso ecológico del agua, la justa utilización de la energía, la autodeterminación de los pueblos, la defensa del territorio, la justicia ambiental y climática y el respeto a los derechos humanos, nos hemos encontrado en Temacapulín. Nos hemos reunido en un pueblo que se ve en peligro de ser destruido por la construcción de la represa El Zapotillo. Estamos en solidaridad con nuestros anfitriones generosos en Temaca y apoyamos su exigencia para la cancelación de la presa El Zapotillo. Temaca debe vivir, y su lucha es nuestra lucha.
Asimismo, nos solidarizamos con las luchas del Movimiento Mexicano de Afectados por las Presas y en Defensa de los Ríos (MAPDER) y con las comunidades, pueblos y ciudades de diversos lugares de México, que en estos momentos se encuentran inundadas o sepultadas por toneladas de lodo a causa de la fractura o el desfogue de represas en el país. La crisis climática desato su furia enfrentándonos a excesivas lluvias, a ríos desbordados y a represas peligrosas que se encuentran a su máxima capacidad. Por lo que denunciamos y rechazamos la política obsoleta y desenfrenada de construcción de presas.
¡Aguas para la vida, no para la muerte! El grito hecho en el Primer Encuentro Internacional de Afectados por Represas, realizado en Curitiba, Brasil, 1997, se reafirmó en la Segunda Reunión Internacional en 2003 en Rasi Salai, Tailandia, y nuevamente recobró fuerza durante estos intensos días en Jalisco, en la comunidad de Temacapulín.
Nuestros Logros
Desde Rasi Salai, hemos seguido unidos trabajando para enfrentar a la industria de represas, y a los gobiernos e instituciones financieras que promueven y financian sus actividades destructivas. Nuestras luchas han derrotado a proyectos de presas y ayudado a restaurar y proteger los ríos. Hemos alcanzado importantes conquistas en la lucha por el derecho al consentimiento informado sobre los proyectos en nuestras tierras y por dignas reparaciones y condiciones de reasentamiento.
Estamos implementando con éxito, bajo control comunitario, numerosas experiencias con tecnologías y programas justos y ecológicamente responsables para satisfacer nuestras necesidades de energía, agua, saneamiento y protección contra inundaciones destructivas.
Hemos logrado crear y fortalecer diversas redes regionales, frentes y movimientos nacionales de luchas contra las represas y por los derechos de los afectados. Estamos construyendo un nuevo modelo de producción y uso de energía y de manejo de agua que satisfaga las necesidades de los pueblos, antes que el interés de las corporaciones nacionales y transnacionales.
Nuestros Desafíos
A 10 años de emitidas las importantes recomendaciones de la Comisión Mundial de Represas, en la mayoría de nuestros países, los derechos de las poblaciones continúan siendo violados por la construcción de represas. Los ríos siguen siendo represados y transvasados, las selvas inundadas, los peces y otras especies exterminadas. En abierta violación de acuerdos internacionales y leyes nacionales, pueblos indígenas y tribales, minorías étnicas y comunidades tradicionales son desproporcionadamente saqueadas y afectadas por la salvaje explotación de sus territorios, tierras y recursos. En muchas partes son obligados a luchar para no ser aniquilados física y culturalmente. Comunidades ribereñas, campesinas y urbanas ven las represas destruir sus modos y medios de vida.
Las mujeres sufren de forma aún más dramática las rupturas de la vida comunitaria y familiar resultante de la construcción de represas. En muchas partes, son discriminadas en los procesos de reasentamiento y reparación. Además, la concentración de miles de trabajadores durante la fase de la construcción muchas veces viene acompañada de prostitución, epidemias y deterioro de los servicios de educación y salud que conciernen de manera muy directa e inmediata la vida de las mujeres.
Jóvenes, ancianos y ancianas también son particularmente vulnerables a las transformaciones económicas, sociales y culturales provocadas por las presas.
La represión de las comunidades y organizaciones que resisten a las presas y la militarización de los territorios, constituye un flagrante atropello a los derechos humanos. Nuestros muertos y perseguidos cuentan una triste historia de la violencia de los constructores de represas, pero también de la resistencia heroica de los pueblos afectados y de su firme decisión de llevar adelante la lucha por un nuevo modo de usar el agua, de producir y utilizar la energía a servicio del pueblo.
Los procesos de privatización impulsados en los años 90 por el FMI y el Banco Mundial transformaron la producción de energía y el agua en un grande negocio. Las corporaciones hacen lucros exorbitantes en la construcción de presas, en el agro-negocio, en el hidro-negocio y en la minería.
Muchos países retornan a una situación semi-colonial para alimentar el capitalismo consumista que domina la sociedad contemporánea.
Grandes represas reducen la capacidad de las sociedades y ecosistemas para adaptarse al calentamiento global. El cambio climático está causando graves daños a las personas y a los ecosistemas, haciendo las represas aún menos seguras, menos viables económicamente, acelerando la sedimentación de los embalses. Los grandes embalses son una fuente importante de gases de efecto invernadero (GEI).
Nos oponemos al mal llamado “Mecanismo de Desarrollo Limpio” (MDL) que los gobiernos poderosos y el capital privado promueven para compensar sus emisiones de GEI, incluyendo a las represas como energía limpia y renovable. Nos sumamos a las acciones que desarrollará el movimiento global por la justicia climática, en el marco de la Conferencia de las Partes, que se llevará a cabo en la ciudad de Cancún, México el presente año.
Nos solidarizamos y nos sumamos a las luchas de la Vía Campesina por la soberanía alimentaria, que es inseparable de control popular del agua y de la soberanía energética.
Nos solidarizamos y nos sumamos a los que luchan contra la minería y la privatización del agua.
Nuestras Demandas
Las experiencias compartidas y estos cinco días de ricos intercambios nos permiten acordar que:
- Reafirmamos los principios y demandas de las declaraciones de Curitiba y Rasi Salai.
- Nos oponemos a la construcción de todas las represas social y ambientalmente destructivas. Nos oponemos a la construcción de cualquier represa que no haya sido aprobada por las poblaciones afectadas, luego de un genuino proceso debidamente informado y participativo, y que no satisfaga las necesidades básicas priorizadas por las mismas comunidades.
- Gobiernos, instituciones financieras y corporaciones deben someter todas las decisiones sobre represas a la aceptación pública y consentimiento informado por los afectados, como fue recomendado por la Comisión Mundial de Represas, incluyendo las poblaciones aguas abajo y aguas arriba de la presa.
- Los servicios prestados por las represas existentes debe ser optimizados, el daño social y ambiental minimizado y reparado/compensado, antes de la construcción de cualquier nuevo proyecto.
- Demandamos el respecto total al conocimiento y manejo tradicionales de los territorios de los pueblos indígenas y tribales, comunidades tradicionales y campesinos y de sus derechos colectivos a la autodeterminación y libertad, su consentimiento previo e informado en la planificación y toma de decisiones sobre el agua y la energía.
- Las reparaciones deben ser negociadas y dadas a los millones de personas que han sufrido a causa de las represas, incluyendo la provisión de tierras, viviendas e infraestructura social. Los constructores y promotores de represas, y los que se benefician de las presas, son los que deben pagar los costos de las reparaciones. Deben ser promovidos programas y planes de recuperación y desarrollo económico y social de las poblaciones afectadas bajo control popular.
- Rechazamos la militarización de nuestros territorios. Exigimos el cese del uso de toda forma de violencia e intimidación contra las personas amenazadas y afectadas por represas y organizaciones que se oponen a las mismas. Rechazamos la militarización de los territorios y el uso de presas y aguas para fines militares. Exigimos que los gobiernos y organizaciones internacionales respecten y protejan los derechos humanos y cesen las persecuciones contra dos defensores de esos derechos
- La equidad de género debe ser respetada en todas las políticas, programas y proyectos sobre agua y energía.
- Deben realizarse acciones, incluyendo el desmantelamiento, para restaurar los ecosistemas y los estilos de vida que han sido dañados por las represas.
- Rechazamos la privatización de los sectores de energía y agua. Demandamos el control público, efectivo y democrático y la regulación de los servicios de electricidad y agua. Agua y energía no pueden seguir siendo tratados como mercancía, pues son un bien público. Como lo ha reconocido la Asamblea de las Naciones Unidas, el agua es un derecho humano fundamental, lo que responsabiliza a los gobiernos asegurar el acceso universal al agua de buena calidad; así como asegurar la protección de los recursos hídricos de toda contaminación.
- Las políticas de agua y energía deben ser objeto de amplias y democráticas consultas públicas. En algunos países el dialogo sobre la implementación de recomendaciones de la CMR pueden contribuir de manera relevante.
- Los gobiernos deben proteger la seguridad de las poblaciones aguas abajo y aguas arriba de las represas existentes, incluyendo inversiones suficientes en la seguridad de las represas, un manejo responsable y participativo de las mismas y elaboración de planos participativos de protección ó evacuación en caso de ruptura y descargas de emergencia.
- Los afectados por presas construidas en un país fronterizo tienen el derecho a ser consultados sobre su construcción y operación. Autoridades de cuencas nacionales e internacionales deben ser participativas y transparentes, e incluir representantes de movimientos sociales y organizaciones no gubernamentales.
- Los gobiernos deben invertir fuertemente en la investigación y aplicación de tecnologías energéticas y manejo de agua ecológicamente responsables. Los gobiernos deben implementar políticas que desincentiven el desperdicio y sobreconsumo, y garantizar la distribución equitativa de la riqueza.
- Rechazamos los subsidios del Mecanismo de Desarrollo Limpio para proyectos hidroeléctricos destructivos, y nos oponemos a todos los mecanismos de mercado de carbono.
- Hidrovías deben seguir el principio “adaptar el barco al río, no el río al barco”
Nos Comprometemos a
- Intensificar nuestras luchas y campañas contra las represas, por los derechos de las poblaciones amenazadas y afectadas, y por la reparación integral de sus pérdidas y restauración de las cuencas.
- Trabajar para la implementación de métodos de manejo del agua y energía, tales como la cosecha de lluvia y modelos comunitarios de energía renovables.
- Luchar contra el modelo consumista y desarrollar campañas contra el consumo de productos intensivos en energía.
- Seguir discutiendo y construyendo colectivamente los principios y directrices de un modelo energético y del manejo del agua, basado en la responsabilidad ambiental y al servicio de los pueblos.
- Intensificar los intercambios entre activistas y movimientos que trabajan sobre represas, agua, energía, justicia ambiental y climática; incluyendo visitas recíprocas con intercambio de personas afectadas de diferentes países.
- Fortalecer nuestros movimientos uniéndolos con otros que luchan contra el modelo de desarrollo neoliberal, y por una justicia global ecológica y social.
- Celebrar cada año el Día de Acción contra las Represas y por los Ríos, el Agua y la Vida (14 de Marzo).
Nuestra lucha en contra las represas destructivas y el modelo actual de manejo de agua y energía, es también una lucha contra un orden social dominado por el imperativo de maximizar sus ganancias, y es una lucha por una sociedad basada en la equidad y la solidaridad.
¡Otro modelo de manejo de energía y agua es posible!
¡Aguas para la vida, no para la muerte!
¡Agua y energía no son mercancía!
¡Ríos libres para pueblos libres! 

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Marina: a responsabilidade de vinte milhões de votos


Foto: mastersuno.blogspot.com
Quando lançaram o "Movimento Marina Presidente” aderi de imediato. Marina Silva seria a peça que faltava no jogo político a favor do meio ambiente e dos movimentos sociais. Fiel à posição assumida de impulso ou ao meu subconsciente que ansiava colocar na pauta governista a questão ambiental e social, assisti ao ato da sua filiação ao Partido Verde. Seu discurso foi emocionante.[1]

Telma Monteiro

As frustrações dos movimentos sociais e dos ambientalistas durante o governo Lula decorreram, principalmente, das indecisões ou fraquezas de Marina à frente do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Ela nos entregou aos leões e nos levou ao desespero quando descartou a discussão sobre o futuro da Amazônia diante do autoritarismo de Dilma Rousseff, mãe dos Planos de Aceleração do Crescimento (PAC1 e PAC2). Para mim, Marina Silva simplesmente se acovardou quando deixou o ministério.

E com isso, infelizmente, acabamos nas mãos de Carlos Minc, seu substituto no MMA e agora de Izabella Teixeira, a atual ministra. Esse ônus Marina legou aos que acreditaram, ingenuamente, ser possível tratar de desenvolvimento sustentável no governo de Lula que apesar de não ter invisibilizado os movimentos sociais, também não lhes deu o respeito que merecem.

Marina errou e se deixou convencer por argumentos errados em momentos cruciais das nossas lutas, como quando se dobrou ao lobby dos transgênicos ou quando foi enganada quanto à viabilidade ambiental e social das usinas do Madeira. Acreditou na fábula sobre menores impactos ambientais e sociais meramente pela adoção das famigeradas turbinas bulbo e da usina a fio d’água, entre outros engodos. Em ambos os casos ela e assessores ignoraram e descartaram as centenas de provas produzidas pela sociedade civil e acabaram reféns de um modelo de desenvolvimento perverso instrumentalizado com obras faraônicas. Belo Monte é decorrência disso.

Nós precisávamos de Marina Silva como a terceira via, sim, mas dentro do governo Lula, enfrentando a guerra contra a opção por um modelo desenvolvimentista predatório, ao lado das populações tradicionais e a favor da equidade social. A terceira via que ela quis criar com o PV, ao contrário do que esperavam, poderá simplesmente nos fazer retroceder nas questões já avançadas que vão desde exploração dos recursos naturais em terras indígenas até a ressurreição da energia nuclear.

O PV fisiologista, de Gabeira a Zequinha Sarney, ficou eufórico em assumir a responsabilidade de acolher a Marina presidenciável e viveu seus minutos de glória resvalando para a história como receptáculo de um mito descartado. Mas o PV não tem estofo nem para receber a bagagem ética de Chico Mendes que resta em Marina.

Marina talvez tenha acreditado na utopia de reconstrução do conteúdo programático do PV, coagida pelo desafio ou pela fé em alguns dos seus integrantes. Ela não entendeu que é difícil reconstruir aquilo que não existe no PV: conteúdo programático - a palavra certa seria construir e não reconstruir.  Só vimos, mesmo, um esforço pífio para emplacar o tema sustentabilidade e não um anseio de construir um conteúdo efetivo de respeito ao meio ambiente, aos movimentos sociais e aos povos indígenas.

O tal conteúdo programático do PV na campanha de Marina Silva não aprofundou temas como os direitos indígenas e quilombolas, matriz energética, incentivos a fontes alternativas de energia, programas de eficiência energética ou hidrelétricas na Amazônia. Eu tive a oportunidade de testemunhar, em duas ocasiões, em que Marina Silva se limitou a dizer sobre Belo Monte que “movimentos sociais e indígenas estão dizendo que não foram ouvidos”.  Simples semântica. Falar em Belo Monte e posicionar-se publicamente contra sua construção parecia ser blasfêmia!

Marina, ministra, cercou-se de assessores e representantes de ONGs que a seguiram para o PV; depois, já candidata, cercou-se de empresas que precisam explorar a riqueza da Amazônia e o trabalho de comunidades extrativistas. Isso rendeu filiações de pe$o para um partido desacreditado e distante do seu inspirador europeu. O Partido Verde brasileiro que assumiu Marina, ou melhor, assumido por ela, não tem pedigree, não tem sustância e não tem identidade. Fragmentado pelo Brasil em miríades de alianças questionáveis eticamente e dissociadas da causa que deveria defender, o grupo dos verdes é um anátema que ambicionou abrigar o mito e chegar onde não poderia por si mesmo.

Triste, pois, que, com a Marina e suas falas às vezes emocionantes, estivessem também os mesmos já omissos integrantes do seu staff no MMA e coadjuvantes das decisões causadoras de males que a história futura comprovará. Sob a égide da Marina que um dia se inspirou em Chico Mendes, assessores facilitaram o caminho para o licenciamento ambiental de empreendimentos que amargarão a vida de gerações futuras, cujos direitos a ministra do meio ambiente, reverenciada internacionalmente,  deveria ter defendido.

A tentativa do Partido Verde de chegar à presidência com Marina, por enquanto, virou pó e poderá catapultar ao poder interesses que condenarão ecossistemas e povos tradicionais, os mais fragilizados, à derradeira destruição. Marina é ingênua e crédula? Sonhadora e ética?

Marina Silva terá que mostrar autoridade, firmeza e coragem para desfazer os erros que cometeu em momentos cruciais e resgatar a dívida que contraiu como ministra. Terá também que honrar a responsabilidade que adquiriu ao receber quase 20 milhões de votos. Por sua vez, o Partido Verde quer renascer das cinzas do verde que pouco defendeu ao apresentar uma “plataforma programática mínima” aos candidatos à presidência.


[1] Esse texto é reedição de outro, de minha autoria, intitulado “Marina errou em momentos cruciais” publicado em setembro de 2009

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Belo monte de violências (III)

Artigos de Felício Pontes Jr., procurador da República no Pará e mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC-Rio.

Organizada em nove textos, a série de artigos está sendo publicada semanalmente pelo Diário do Pará aos domingos, no caderno Brasil.

Este é o terceiro texto da série de artigos “Belo Monte de Violências”, que pretende informar o porquê de o Ministério Público Federal (MPF) ter ingressado com nove ações judiciais contra o projeto de construção da Usina Hidrelétrica (UHE) de Belo Monte, no rio Xingu. Cada semana uma ação é comentada neste espaço.
Os dois primeiros artigos demonstraram que o licenciamento foi realizado sem que nenhuma comunidade indígena atingida fosse ouvida pelo Congresso Nacional, o que é contrário ao artigo 231 §3º Constituição do Brasil. Portanto, a UHE de Belo Monte passou pelo Congresso em tempo recorde, sem a realização do grande debate nacional.
Como as decisões favoráveis ao MPF estavam suspensas no ano de 2007, o Governo federal se apressa em licenciar a obra. Mas comete um grave erro. O Estudo de Impacto Ambiental estava sendo realizado sem o Termo de Referência.
O Termo de Referência é o documento expedido pelo licenciador (Ibama), onde constam as matérias que devem ser estudadas pela empresa responsável pela obra. É uma espécia de guia de estudo sobre o que deve constar no Estudo de Impacto Ambiental (EIA). Por isso, sempre antecede o EIA.
Mas não apenas isso. O MPF descobre que a Eletrobras havia contratado uma sociedade de consultoria chamada “e.labore”. Esta produziu um documento chamando a atenção para este fato e dizendo que deveria haver cuidado com o discurso da Eletrobras na imprensa: “Mudar, devido às circunstâncias emergenciais, o escopo do nosso discurso estratégico, se provocados pela mídia e/ou sociedade, para explicar a realização dos atuais estudos, antes da consolidação do Termo de Referência.”
A mesma empresa sugeriu à Eletrobras algo que não tem previsão legal. Queria que o Ibama de Brasília autorizasse “que o escritório de Altamira tome as seguintes inciativas: expedir, em caráter emergencial, um termo de referência padrão/genérico...”
O pequeno escritório do Ibama em Altamira jamais poderia produzir tal documento. Não possui pessoal habilitado para dizer o que deveria ser estudado para medir o impacto ambiental da terceira maior hidrelétrica do mundo, como propaga o Governo.
Esse fato demonstra a forma descuidada com que a Eletrobras trata dos impactos ambientais sociais e ambientais da UHE Belo Monte. O licenciamento parece ser algo feito por mera formalidade. Pouco importa a qualidade da água que será utilizada pelos habitantes de Altamira, nem tampouco a falta de água no trecho de 100 quilômetros do Rio Xingu que atingirá em cheio as Terras Indígenas Paquiçamba e Arara da Volta Grande. Isso para ficar apenas em dois exemplos.
Fato curioso nesse processo foi que o Diretor de Licenciamento Ambiental do Ibama, em 08 de fevereiro de 2007, declarou ao MPF que “em relação ao processo de licenciamento ambiental do Aproveitamento Hidrelétrico Belo Monte... informo que o Termo de Referência... não foi elaborado pela equipe técnica em função de decisão liminar ter impedido a realização de vistoria técnica ao local.
Porém, cerca de dez dias depois, quando a decisão favorável ao MPF deixou de valer, o Termo de Referência foi confeccionado pelo Ibama. É evidente que não houve tempo para qualquer vistoria no local.
Diante desses fatos, o MPF processa a Eletrobras, exigindo a paralisação imediata do EIA sem o Termo de Referência. Não consegue sucesso na Justiça Federal em Altamira, que extinguiu o processo em julgamento antecipado, sem permitir a colheita de mais provas. O MPF recorre ao Tribunal Regional Federal em Brasília, que até hoje não julgou o caso.

sábado, 2 de outubro de 2010

Belo Monte e a palavra do presidente

CARTA ABERTA: Belo Monte e a palavra do presidente

No dia 22 de julho de 2009, o presidente Lula recebeu no Palácio do Planalto uma delegação de lideranças indígenas e sociais, representantes da comunidade científica e o bispo da Prelazia do Xingu, Dom Erwin Kräutler para uma audiência sobre a controversa megahidrelétrica de Belo Monte. Na ocasião, os representantes da sociedade civil expuseram ao presidente uma série de questionamentos sobre os enormes riscos e impactos socioambientais de Belo Monte, bem como sobre a duvidosa viabilidade econômica do empreendimento. Ao final da reunião, Lula deu a sua palavra de que o governo federal "não enfiaria Belo Monte goela abaixo" de povos indígenas, movimentos sociais e outros grupos da sociedade brasileira. Assim, ele afirmou que o governo estava aberto ao diálogo e, como um primeiro passo, seriam providenciadas respostas imediatas aos questionamentos sobre:

• impactos sociais e ambientais do Complexo Belo Monte sobre os povos indígenas, ribeirinhos e outras populações locais da bacia do Xingu, especialmente no trecho de 100 km da Volta Grande do Xingu, que pode vir a ficar praticamente sem água com o desvio do rio;

• a ineficiência energética do projeto, que produziria uma media anual de apenas 40% da capacidade instalada e, em boa parte do ano operaria com menos de 20%, ou até mesmo menos de 10%, em função da forte sazonalidade do rio Xingu;

• o valor dos investimentos necessários para o empreendimento e a sua viabilidade econômica, considerando os custos de construção, a reduzida capacidade de geração de energia e os reais custos de prevenção e mitigação de impactos socioambientais;

• a tarifa a ser cobrada da população brasileira pela energia produzida por Belo Monte, assim como a utilização da mesma para subsidiar industrias eletro-intensivos, sobretudo para a fabricação de alumínio; e

• garantias efetivas de que não serão construídas outras usinas no Rio Xingu, Altamira, Pombal e São Felix do Xingu, que teriam impactos sociais e ambientais cumulativos muito maiores, sobretudo para os povos indígenas.

Desde a reunião de julho de 2009, o comportamento do governo federal tem sido o oposto daquele que foi prometido pelo presidente Lula. Enquanto todos os questionamentos acima ficaram sem resposta, o governo simplesmente tem se recusado a dialogar com a sociedade civil e outros atores, inclusive negando-se a participar de audiências públicas sobre Belo Monte organizadas em Brasília pelo Ministério Público Federal e pelas Comissões de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e do Senado.

Mais grave ainda, têm ocorrido verdadeiras investidas contra instituições democráticas do país, construídas a duras penas ao longo de décadas, inclusive durante a ditadura militar. Alguns exemplos desse comportamento incluem:

• audiências públicas realizadas de forma absolutamente irregular, em número insuficiente em locais nos quais a maioria da população mais ameaçada pelo empreendimento não teve oportunidade de participar. Nessas audiências, foi discutido superficialmente um Estudo de Impacto Ambiental incompleto, distorcido da realidade e sem adequada divulgação prévia, e sob um forte aparato policial repressivo;

• descumprimento do artigo 231 da Constituição Federal e da Resolução 169 da OIT, que asseguram aos povos indígenas o direito à consulta e ao consentimento livre, prévio e informado sobre grandes empreendimentos que afetam seus territórios e suas vidas;

• concessão "política" da Licença Prévia para Belo Monte sob forte pressão da Casa Civil, contrariando pareceres das equipes técnicas do IBAMA e da FUNAI;

• uso de falsos argumentos por desembargadores do Tribunal Regional Federal (TRF1), invocando o fantasma de um apagão no setor elétrico, para justificar a derrubada de liminares concedidas por juízes contra a Licença Prévia e o leilão de Belo Monte, em favor de ações movidas pelo Ministério Publico Federal e por entidades da sociedade civil;

• ameaças pela Advocacia Geral da União (AGU) contra juízes federais, procuradores da república e entidades da sociedade civil que têm movido ações judiciais contra irregularidades no licenciamento ambiental de Belo Monte;

• alterações de última hora em leis e regulamentos financeiros para conceder um pacote inédito de crédito subsidiado, além de incentivos fiscais, com dinheiro do contribuinte brasileiro, para um empreendimento sem comprovação para a sociedade de sua viabilidade técnica e econômica;

• anúncios de investimentos de fundos de pensão de empresas estatais (Petros, Previ, Funcef) em Belo Monte, ignorando riscos financeiros para investidores e o desrespeito a diretrizes de responsabilidade socioambiental dos mesmos.

No final de agosto, Lula assinou o Decreto de Outorga que permite a Contrato de Concessão para a UHE Belo Monte ao Consórcio Norte Energia. Na oportunidade, afirmou que seu governo se diferencia de seus antecessores no tratamento de Belo Monte “por não ter medo de debater” com a sociedade civil (sic!). Tal comentário foi antecedido por declarações igualmente equivocadas numa recente visita a Altamira para “inaugurar” as obras de Belo Monte, onde o presidente hostilizou e procurou ridicularizar e desqualificar os questionamentos sobre o empreendimento.

Ultimamente, o consórcio Norte Energia tem pressionado o IBAMA a aprovar uma Licença de Instalação "parcial" - algo que inexiste na legislação ambiental brasileira - para as chamadas "instalações iniciais" de Belo Monte (canteiro, acampamento, linha de transmissão, travessões de acesso) apesar do fato de que praticamente nenhuma condicionante da Licença Prévia tenha sido cumprida, numa clara tentativa de tornar o empreendimento um "fato consumado".

O Presidente do BNDES, Luciano Coutinho, anunciou recentemente que o banco vai conceder um empréstimo recorde de cerca de R$ 20 bilhões para financiar 80% das obras de Belo Monte, com juros abaixo daqueles pagos pelo Tesouro Nacional, deixando a conta do subsídio a ser paga pelo contribuinte. Enquanto isso, falta ao BNDES um mínimo de transparência sobre os critérios utilizados para a análise da viabilidade econômica e riscos financeiros de Belo Monte, inclusive relacionados aos impactos socioambientais do empreendimento.

Pautado em visões ultrapassadas sobre desenvolvimento econômico incompatíveis com os desafios do século XXI e motivado por laços promíscuos com empreiteiras e interesses eleitorais que se sobrepõem ao interesse público, o governo de Lula descarta oportunidades para promover a eficiência energética e fontes alternativas de energia, enquanto ressuscita um autoritarismo aterrador que imaginávamos ter superado com o fim da ditadura militar.

Se prevalecer a vontade do atual governo, será assinada uma sentença de morte do Rio Xingu e de seus habitantes, em flagrante descumprimento da Constituição Brasileira e de acordos internacionais dos quais o Brasil é signatário, tais como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e a Convenção sobre Diversidade Biológica. É esse o Brasil que queremos? Em que situação ficará a democracia de um pais cujo presidente não honra a própria palavra, enquanto passa do discurso da “ética na política” para a “política da contravenção”?

30 de setembro de 2010

Assinam esta carta os seguintes participantes da reunião com o Presidente Lula em 22/07/09:

- Antonia Melo da Silva - Coordenação do Movimento Xingu Vivo Para Sempre
- Célio Bermann, Professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo
- Dom Erwin Krautler - Bispo da Prelazia do Xingu e Presidente do Conselho Indigenista Missionário – CIMI
- Felício Pontes Junior, Procurador da República, Ministério Público Federal – Pará
- Idalino Nunes Assis - Representante das comunidades ribeirinhas do Xingu,
- José Carlos Ferreira da Costa - Associação da Resistência Indigena Arara do Maia- Volta Grande do Xingu,
- Lucimar Barros Silva - representante dos moradores da Agricultura familiar da Volta -Grande do Xingu,
- Ozimar Pereira Juruna - representante da Aldeia Juruna Paquisamba - Volta Grande do Xingu


Endossam esta carta as seguintes organizações da sociedade civil:

ABONG – Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais
Amigos da Terra – Amazônia Brasileira
Articulação das Mulheres do Amazonas
Articulação de Mulheres Brasileiras - AMB
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil - APIB
Associação Ação e Atitude
Associação Alternativas para a Pequena Agricultura no Tocantins -APA-TO
Associação Brasileira dos Estudantes de Engenharia Florestal – ABEEF
Associação da Agricultoras do PDS Assurini
Associação da Resistência Indígena Arara do Maia - ARIAM
Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé
Associação de Desenvolvimento da Agroecologia e Economia Solidária - ADA AÇAÍ
Associação de Mulheres Campo e Cidade Emanuele de Porto de Moz
Associação de Mulheres Domésticas de Santarém
Associação de Mulheres Trabalhadoras de Alenquer Campo e Cidade
Associação de Proteção ao Meio Ambiente de Cianorte - APROMAC
Associação de Saúde Ambiental- TOXISPHERA
Associação do Movimento Interestadual de Quebradeiras de Coco Babaçu - Regional Pará
Associação do Povo Indígena Juruna do Xingu
Associação dos Agricultores da Volta Grande do Xingu
Associação dos Agricultores Ribeirinhos do PDS Itatá
Associação dos Índios Moradores de Altamira
Associação Floresta Protegida
Associação Global de Desenvolvimento Sustentado
Associação Metareilá do Povo Indígena Suruí - Metareilá
Associação Nacional de Ação Indigenista da Bahia
Associação para o Desenvolvimento Integrado e Sustentável – ADEIS
Associação Paraense de Apoio às Comunidades Carentes - APACC
Associação Pro-Moradia do Parque Ipê Associação Rádio Comunitária de Altamira -Nativa
CAMPA
Centro de Defesa dos Direitos Indígenas de Altamira - CDDI
Centro de Educação e Assessoria Popular – CEAP
Centro de Pesquisa e Assessoria Esplar
Centro de Referência do Movimento da Cidadania pelas Águas Florestas e Montanhas
CEPEDES - Centro de Estudos e Pesquisas para o Desenvolvimento do Extremo Sul
Comitê de Desenvolvimento Sustentável Porto de Moz
Comitê Dorothy
Comitê em Defesa da Vida das Crianças Altamirenses
Comitê Independente por Justiça Ambiental - C.I.J.A
Comitê Metropolitano Xingu Vivo para Sempre, Belém/PA
Conselho Indígena de Altamira – COIA
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
Conselho Municipal da Cidade de Porto Velho
Conservação Internacional - Brasil
Cooperativa dos Produtores Rurais do PDS Esperança-Anapu
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB
Coordenación de las Organizaciones Indígenas de la Cuenca Amazônica - COICA
FAMCOS
Federação das Associações de Moradores e Organizações Comunitárias de Santarém –
Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional - FASE AMAZÔNIA
Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil – FEAB
FEM- Fundação Irmã Elza Marques
Fórum Brasileiro de Economia Solidária - FBES Fórum Carajás
Fórum da Amazônia Ocidental - FAOC
Fórum da Amazônia Oriental - FAOR
Fórum das Mulheres da Amazônia Paraense – FMAP
Fórum de Mulheres da Amazônia Paraense - FMAP
Fórum dos Direitos Humanos Dorothy Stang Regional Transamazônica e Xingu
Forum Mudanças Climaticas e Justiça Social
Forum Popular de Altamira
Frente Cearense Por uma Nova Cultura de Àgua
Fundação Tocaia
Greenpeace
Grupo Ambientalista da Bahia – Gamba
Grupo de Articulação dos Direitos Indígenas de Altamira
Grupo de Defesa da Amazônia – GDA
Grupo de Mulheres Brasileiras – GMB
Grupo de Trabalho Amazônico - GTA
Iguassu Iterei
Instituto Amazônia Solidaria e Sustentável – IAMAS
Instituto Ambiental Vidágua
Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas - IBASE
Instituto Brasileiro de Inovações Sociedade Saudável - IBISS-CO
Instituto de Estudos Socioeconômicos – Inesc
Instituto de Pesquisas em Ecologia Humana
Instituto Humanitas
Instituto Madeira Vivo – IMV
Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul – PACS
Instituto Socioambiental - ISA
Instituto Terramar
Instituto Universidade Popular UNIPOP
International Rivers
Iterei – Refugio Particular de Animais Nativos
Justiça Global
Mana-Maní Círculo Aberto de Comunicação, Educação e Cultura
Movimento Articulado de Mulheres da Amazônia – MAMA
Movimento de Mulheres Campo e Cidade de Uruará '
Movimento de Mulheres do Campo e Cidade do Pará
Movimento de Mulheres Regional Transamazônica e Xingu
Movimento de Mulheres Trabalhadoras de Altamira Campo e Cidade
Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH
Movimento Tapajós Vivo
Movimento Xingu Vivo para Sempre – MXVPS
Núcleo Amigos da Terra Brasil
Operação Amazônia Nativa – OPAN
Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi - OPIAJ
Organização Não Governamental Arirambas - ARIRAMBAS
Organização pelo Desenvolvimento da Amazônia com Direitos Humanos - ONDAS-DH
Organização Universalista em Direitos Humanos – U.S.O.S.
Prelazia do Xingu
Rede Alerta contra o Deserto Verde
Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais
Rede Brasileira de Arteducadores
Rede Brasileira de Justiça Ambiental
Rede Jubileu Sul Brasil
Sindicato das Trabalhadoras Domésticas Região Transamazônica e Xingu
Sindicato de Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais de Altamira
Sindicato de Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais de Porto de Moz
Sindicato de Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais de Vitória do Xingu
Sindicato dos Oleiros de Altamira
Sindicato dos Trabalhadores em Educação Publica do Pará - Sub-Sede Altamira/PA
Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Pará - Regional Transamazônica /Xingu
Sociedade Caritativa Litéraria São Francisco de Assis - SOCALIFRA
Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos – SDDH
Survival International
Terra de Direitos
Terræ Organização da Sociedade Civil
União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira - UMIAB
União dos Estudantes de Ensino Superior de Santarém (UES) 

Ferrogrão – soja no coração da Amazônia

Estudo Preliminar 3 - Ferrogrão e a Soja na Amazônia                                                        Imagem: Brasil de Fato   ...