domingo, 22 de fevereiro de 2009

Frases ouvidas nos eventos em Brasília, dias 18 e 19 de fevereiro

“A EPE não muda a realidade, ela capta a realidade e planeja com ela” . 
Mauricio Tolmasquim, em defesa do PDEE durante a Audiência Pública, em 18 de fevereiro de 2009, na Procuradoria Geral da República, em Brasília. 

 “O PDEE não é inovador uma vez que apenas repica o passado”
Suzana Kahn, representante do MMA, durante a Audiência Pública para discutir o PDEE.

“Se você fosse meu aluno eu o reprovaria”
Carlos Vainer para Maurício Tolmasquim sobre o PDEE, durante a Audiência Pública, em 18 de fevereiro de 2009. Clique aqui para ler todas

“No Canadá os índios pediram as hidrelétricas. Vamos [o MME] trabalhar para que os índios brasileiros também peçam”
Altino Ventura Filho quando informou que um potencial de 80 GW de energia hidrelétrica está indisponível por se encontrarem em UCs e Terras Indígenas. Colóquio – Conservação e Eficiência Energética, no MME, em 19 de fevereiro de 2009.

“Esses 80 GW [ potencial de energia hidrelétrica em UCs e Terras Indígenas] não podem ser aproveitados agora, mas serão reexaminados”
Altino Ventura Filho, Colóquio – Conservação e Eficiência Energética, no MME, em 19 de fevereiro de 2009.

“15% das 71 usinas hidrelétricas previstas no PDEE estão em Unidades de Conservação da Amazônia”.
Dra. Sandra Cureau, durante a Audiência Pública sobre o PDEE, em 18 de fevereiro de 2009.

“A projeção de energia eólica no PDEE é de 0,3% para 0,9%”
Dra. Sandra Cureau, na abertura da Audiência Pública para discussão do PDEE, em 18 de fevereiro de 2009.

“Não é um plano estratégico [o PDEE], é um plano físico, de expansão física” 
Altino Ventura Filho, na Audiência Pública de discussão do PDEE, em 18 de fevereiro de 2009.

“A sociedade brasileira precisa da energia da Amazônia. O MME vai atender esse mercado”
Altino Ventura Filho, na Audiência Pública de discussão do PDEE, em 18 de fevereiro de 2009.

“Dos 346 processos de licenciamento em tramitação [na Funai], 112 são de hidrelétricas”
Eduardo Vieira Barnes (FUNAI), durante a Audiência Pública de discussão do PDEE, em 18 de fevereiro de 2009.

“Vamos trocar 10 milhões de geladeiras. A idéia não é minha, não. Ela é do Presidente Lula. Vejam que além de tudo o que ele faz, ainda tem tempo de pensar nisso”.
Ministro Edison Lobão, durante o Colóquio – Conservação e Eficiência Energética, no MME, em 19 de fevereiro de 2009.

“O Brasil fechou acordo para construir hidrelétricas no Peru. São cinco, com a primeira já contratada e depois mais 10 [totalizando 15 hidrelétricas] e mais 2 na Argentina. Vamos incorporar todos esses Mws ao Brasil”.
Ministro Edison Lobão, durante o Colóquio – Conservação e Eficiência Energética, no MME, em 19 de fevereiro de 2009.

“Vamos fazer uma troca com a Venezuela. Na época em que falta energia lá nós mandaremos a energia daqui e na época em que falta energia aqui eles mandarão de lá.”
Ministro Edison Lobão, durante o Colóquio – Conservação e Eficiência Energética, no MME, em 19 de fevereiro de 2009.

“2009 é o ano da hidrovia”
Marcelo Perrupato, Secretário de Política Nacional de Transportes, durante o Colóquio – Conservação e Eficiência Energética, no MME, em 19 de fevereiro de 2009.

“O objetivo do plano é o pleno aproveitamento do potencial hidráulico”
Altino Ventura Filho, Colóquio – Conservação e Eficiência Energética, no MME, em 19 de fevereiro de 2009.

Sociedade condena o Plano Decenal de Energia da EPE

Telma Delgado Monteiro 

A sociedade mostrou que o Plano Decenal de Expansão de Energia (PDEE) 2008/2017, elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), deve ser refeito. A Audiência Pública para discutir o plano foi organizada pelo Ministério Público Federal, 4ª e 6ª  Câmaras de Coordenação e Revisão, no dia 18 de fevereiro, em Brasília. Contou com representantes de ONGs, de especialistas, do governo e de procuradores federais de vários estados brasileiros.  Clique aqui para ler todo o relato

Abertura

A Coordenadora da 4ª Câmara de Revisão – Meio Ambiente e Patrimônio Natural, Dra. Sandra Cureau, abriu a audiência e questionou a estratégia de expansão de energia que prevê 71 novas hidrelétricas na Amazônia, aumento em 172% das emissões de gases de efeito estufa devido às termelétricas e o insipiente  aumento da geração eólica. Para o Ministério Público, explicou, o objetivo da Audiência Pública não é apontar a melhor fonte ou questionar as decisões do governo quanto à matriz energética, e sim fazer com que haja a participação ampla da sociedade na análise do PDEE. 

A Coordenadora da 6ª Câmara de Revisão – Índios e Minorias, Dra Deborah Duprat, mencionou a convenção 169 da OIT que estabelece como conceitos básicos a consulta e a participação dos povos indígenas interessados e o direito desses povos de decidir sobre suas próprias prioridades de desenvolvimento na medida em que afete suas vidas, crenças, instituições, valores espirituais e a própria terra que ocupam ou utilizam. Para ela, a consulta pública do PDEE, pela internet, não atingiria os objetivos de ouvir a sociedade. Esclareceu, ainda, que a Análise Socioambiental do PDEE não abordou com propriedade o deslocamento das populações nos projetos hidrelétricos.

O Dr. Akira Omoto, Coordenador do Grupo de Trabalho - Licenciamento de Grandes Empreendimentos, se referiu ao alto índice de conflitos decorrentes de grandes empreendimentos e a chave para se evitar isso é a participação democrática nas políticas e projetos. Segundo ele, o novo modelo do setor elétrico ao estabelecer a necessidade da concessão da Licença Prévia (LP) antes do leilão fez com que condicionantes sejam postergadas para uma fase posterior.

O governo defendeu o plano

O Ministério de Minas e Energia (MME) estava representado pelo Secretário de Planejamento e Desenvolvimento Energético, Dr. Altino Ventura Filho, que apenas repetiu o discurso orquestrado pelo governo sobre a “benção” da hidroeletricidade e o fantasma do apagão. Pela EPE, para defender o plano, estava o próprio presidente, Mauricio Tolmasquim, que apresentou os índices de aumento da demanda e classificou como positiva as perdas do sistema, pois são coerentes com a lei da física. 

A representante do Ministério do Meio Ambiente (MMA) fez duras críticas ao plano

O MMA estava representado por Suzana Kahn, Secretária de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental, que condenou o PDEE pela falta de abrangência ambiental e fez críticas  sobre os planos do governo que “não se falam”. Para ela, a variável ambiental é míope e os custos ambientais não estão incorporados aos custos de geração. Suzana sugeriu que o plano do governo de construir 1 milhão de habitações populares incorpore a energia solar.

O representante da FUNAI pediu regulamentação

Eduardo Vieira, Coordenador de Políticas para Populações Indígenas (FUNAI), fez uma apresentação anódina, destituída de paixão onde só mostrou dados estatísticos. Citou o artigo da Constituição Federal que garante a consulta às comunidades indígenas quando se trata de projetos que afetem suas terras e pediu que esse artigo fosse regulamentado.

Os especialistas condenaram o plano 

Célio Bermann, especialista da Universidade de São Paulo, criticou a política energética com visão ofertista.  Energia para quê e para quem, perguntou ele. Os programas não discutem o destino da energia dentro de um plano nacional de desenvolvimento. A economia, ele disse, está subordinada aos setores que consomem muita energia, com baixo valor agregado, para a pura satisfação do mercado internacional. O PDEE desconsiderou os danos ambientais para suprir de energia os setores produtores de aço, celulose, minério de ferro e carboligas, sem que os custos socioambientais fossem incorporados. 

Outro ponto que Bermann abordou foi o processo de “demonização” da questão ambiental e dos ambientalistas promovido por setores do governo. O MP e os ambienalistas são rotulados como obstáculos ao desenvolvimento. 

A última apresentação foi do especialista Carlos Vainer, Universidade do Rio de Janeiro, que considerou o PDEE autoritário, com características de arbítrio e violência. Criticou duramente a Análise Socioambiental do Sistema Elétrico que privilegiou apenas as informações socioambientais fornecidas pelas empresas do setor e ignorou os atores diretamente afetados pelos empreendimentos. 

Para Vainer, é autoritário atribuir ao MME, como está no PDEE, o papel de “apresentar a exposição de motivos justificando sua [dos projetos hidrelétricos] importância estratégica, seguido de diretrizes e recomendações que assegurem não apenas sua continuidade, mas que garantam sua viabilização como projetos de interesse nacional. A implantação desses empreendimentos poderia, inclusive, ser assegurada por algum dispositivo normativo ou legal como, por exemplo, Resolução do CNPE.” Ele solicitou a Mauricio Tolmasquim a retirada imediata dessa frase do texto e pediu que o PDEE fosse refeito. 

A manifestação dos presentes

Depois de mais de cinco horas ininterruptas de apresentações, chegou a vez da platéia se manifestar sobre o PDEE. Os representantes de ONGs corroboraram as críticas dos especialistas e acrescentaram outros questionamentos: (i) a previsão das termelétricas, que causarão um aumento de 172% das emissões de CO², como “castigo” pela demora no licenciamento das hidrelétricas; (ii) a forma superficial na descrição das terras indígenas que serão afetadas por projetos hidrelétricos na Amazônia; (iii) o número subestimado, no PDEE,  da população que será  afetada por aproveitamentos hidrelétricos; (iv) sobre os recursos do BNDES destinados aos grandes empreendimentos que têm os licenciamentos ambientais questionados por ações ajuizadas por ONGs ou pelo MP; (v) sobre o descumprimento do Princípio do Equador pelos Bancos, privados e estatais, que financiam obras insustentáveis ambientalmente; (vi) que não há no PDEE referência à liberação de metano pelos reservatórios das hidrelétricas; (vii) que nas contas do PDEE  não foi incluída  a energia de hidrelétricas que o governo do Brasil pretende construir no Peru.    

Diretamente ao Tolmasquim

No final da audiência abordei diretamente Maurício Tolmasquim sobre um detalhe no PDEE que havia chamado minha atenção entre tantos outros, mas que ainda não tinha sido mencionado pelos participantes. A região Norte seria responsável por 10% da capacidade hidrelétrica instalada até o horizonte de 2017, a energia do Madeira, por  6,3% e o Tapajós/Teles Pires por 5,1%. Perguntei o motivo que levou o plano a descolar o Madeira e o Tapajós da região Norte (leia-se Amazônia). A resposta dele, não muito convincente, foi que a EPE trabalha com uma metodologia cujo critério não é geográfico, mas de sistemas. Rebati que o critério “região Norte” é geográfico. Complementei, então, que estava claro que o objetivo implícito nessa metodologia era um disfarce, nesse caso, para a  verdadeira contribuição da Amazônia na geração de energia. Que será, na verdade, de 21,4% (se somados a região Norte, o Madeira e o Tapajós/Teles Pires). Ele disse que eu tinha razão e que pedir a correção do critério.

Estive presente em dois eventos em Brasília(18 e 19 de fevereiro) como Coordenadora de Energia e Infra-estrutura da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, de Porto Velho, Rondônia


domingo, 15 de fevereiro de 2009

Rio Madeira: causa mortis



Telma Monteiro

Este relato é baseado nos documentos do processo aberto pelo Ibama para apurar os fatos que levaram à mortandade de dezenas de toneladas de  peixes ocorrida em dezembro de 2008, nas obras da usina de Santo Antônio, no rio Madeira, em Rondônia. 

O resgate dos peixes

Em 23 de dezembro de 2008, a coordenação de fiscalização da Superintendência do Ibama, em Rondônia, fez uma Comunicação de Crime pedindo  providências ao MPF para instauração da competente ação penal e/ou Ação Civil Pública (ACP) visando a reparação de dano ambiental. O pedido encerra um extenso relatório técnico do IBAMA acerca do dano ambiental caracterizado por destruição da biota, ocorrido na área das obras das ensecadeiras da Hidrelétrica  Santo Antônio de responsabilidade da Madeira Energia S.A.(MESA).  Continua...

Os procedimentos de resgate dos peixes nas obras das ensecadeiras da Hidrelétrica Santo Antônio começaram em 20 de outubro de 2008, na margem direita do rio Madeira, no local da já extinta cachoeira de Santo Antônio, chamado Ilha do Presídio. O processo construtivo dessas ensecadeiras consiste no lançamento de diques de terra, a montante e a jusante da área a ser ensecada, formando reservatórios isolados do leito rio, com área e volume de água variáveis. Essas áreas represadas devem ser esgotadas por meio de bombas hidráulicas de sucção para que se possa construir a barragem. 

“As capturas deverão ser realizadas por uma equipe da usina treinada e acompanhada por profissionais de nível superior especializados em resgates de peixes e/ou com conhecimento na identificação de possíveis novas ocorrências de espécies ainda não inventariadas.”

Os peixes retidos nessas grandes poças de água precisam ser “translocados” (expressão técnica) ou devolvidos ao rio, pois do contrário morrem por falta de oxigênio em conseqüência das alterações nas propriedades físico-químicas da água. É necessária, para esse procedimento, a atuação de equipes com experientes especialistas que devem ter por objetivo minimizar as perdas de peixes. O resgate tem que ser rápido, tecnicamente irrepreensível, bem planejado e com todo o equipamento indispensável.

Ressalto que, no caso das ensecadeiras de Santo Antônio, o período escolhido para o início do resgate coincidiu exatamente com o “defeso”, época em que os peixes sobem o rio para desova e reprodução. Estão aí, portanto, relatados neste preâmbulo, os quesitos que, não cumpridos, levaram ao desastre. Fazer o resgate da ictiofauna durante o “defeso” incorporou uma exponencial probabilidade de fracasso. E assim, aconteceu.

O desastre

Os eventos que conquistaram as manchetes da mídia começaram no dia 10 de dezembro de 2008, quando o IBAMA, que já tinha sido comunicado pela população sobre o mau cheiro e a presença de urubus que disputavam as carcaças dos peixes mortos, enviou uma equipe para fazer vistoria. De cara, detectaram a agonia de toneladas de peixes, a falta de oxigenação da água, o equipamento inadequado e a demora na operação de resgate. 

Apesar das recomendações feitas aos responsáveis no dia 10/12, em 12/12, de volta ao local, a equipe do IBAMA verificou que os problemas continuavam com toneladas de peixes mortos e a falta de planejamento do pequeno grupo designado para o resgate. Na parte da manhã desse dia (12), os membros da equipe de resgate, ainda sem coordenação e em número insuficiente priorizavam a remoção dos peixes mortos em detrimento do salvamento dos que ainda agonizavam. À tarde havia mais peixes mortos.

No Projeto Básico Ambiental (PBA) está expressa a necessidade de se evitar a mortalidade nessa fase das obras.  O documento de constatação de ordem técnica de 12/12, cita os fatores que induziram ao desastre: a rápida retirada da água das poças, cujo nível baixou 1,5 a 2 m em apenas dois dias; a alteração da temperatura; a qualidade da água; a lentidão na retirada dos peixes; a utilização de equipamento inadequado e insuficiente para a quantidade de peixes; a falta de equipamento para oxigenar a água, entre outros.

No dia seguinte, 13/12, ainda com um monitoramento insipiente, a situação estava tão incontrolável que era impossível proceder à análise e biópsia dos peixes devido ao estado avançado de deterioração da biomassa.  A equipe técnica do IBAMA detectou alterações nas propriedades físico-químicas da água, negligência, imperícia e imprudência do consórcio MESA. Foi feita, então, uma notificação de grave lesão ao meio ambiente e violação da legislação.

Somente nesse dia (13/12), segundo o relato técnico do IBAMA, a responsável técnica pelo resgate da ictiofauna se apresentou à equipe e informou que toda aquela mortandade “era normal” e que os níveis de oxigênio não eram medidos desde o dia 10/12 graças a uma “pane” no aparelho de medição. 

A coordenação técnica do resgate dos peixes nas obras das ensecadeiras da usina de Santo Antônio, no rio Madeira, era da Dra. Carolina Rodrigues da Costa Doria, bióloga, professora da Universidade Federal de Rondônia (UNIR). Sua função no Programa de Resgate da Ictiofauna era de “planejar e coordenar”, “orientar e acompanhar”.

O descaso

A demora entre a retirada dos peixes da água, o despejo nas caçambas metálicas (essas que se usam em ambiente urbano para colocar lixo ou entulho) e o transporte até o rio, comprometia sua sobrevivência. Outros problemas como o controle deficiente da temperaturas das poças, da caçamba e do rio; falta de procedimentos adequados que minimizassem a mortalidade; alta concentração de peixes devido ao “defeso”; além da falta de entendimento prévio sobre a escala da operação, foram apontados.

Os técnicos do IBAMA concluíram que faltou um planejamento que considerasse todas as variantes envolvidas, que não havia conhecimento prático e sobrava displicência. Deixaram, também, consignada, a omissão dos responsáveis, consórcio MESA e  Dra. Carolina, quanto às alternativas técnicas que poderiam ter evitado os danos. Não sem certa indignação, registraram no documento que as fiscalizações do IBAMA autuam pequenos pescadores locais durante o “defeso”, quando a pesca é proibida, enquanto o empreendedor, nesse caso, por incúria, causava a mortandade dos peixes e o “comprometimento de milhares de espécimes da ictiofauna.” 

Durante as vistorias entre os dias 10 e 12/12  o IBAMA exigiu que os peixes ainda vivos, que não teriam condições de sobrevivência devido ao estresse provocado pelo manejo inadequado,  fossem acondicionados em câmara frigorífica para posterior distribuição a instituições beneficentes. Para isso seria preciso obter um laudo que atestasse a saúde dos peixes para consumo humano. O laudo da análise macroscópica foi assinado pela mesma Dra. Carolina Rodrigues da Costa Doria, Coordenadora do Laboratório de Ictiologia e Pesca / UNIR.

Encontrei nesse processo uma planilha de uma página, encaminhada ao Ibama pelo consórcio MESA, sem identificação, timbre ou rubrica de responsável, que confirma que os procedimentos de resgate dos peixes tivera início em 20 de outubro de 2008, na ensecadeira 4 e em 26 de outubro na ensecadeira 2 (de jusante), concluídos em 31/11. Em 1° de novembro começaram os trabalhos na ensecadeira 3, do córrego Mato Grosso, que duraram até 20/11.  Em 21/11 começaram os preparativos na ensecadeira 1 [a do desastre]. E em  8/12 iniciaram  o resgate nessa ensecadeira que durou até 12/12, quando já haviam sido detectadas as  dezenas de toneladas de peixes mortos.

A equipe técnica do IBAMA voltou a fazer vistoria no período entre 15 e 17/12. Constatou que havia ainda um forte odor putrefato, muitos urubus e os peixes coletados estavam sendo levados e soltos na área de atracação de embarcações, local com muitas rochas onde eram arremessados de uma altura de 2,5m. A equipe ainda chamou a atenção para a proximidade do lugar de soltura com o canteiro de obras, onde  não havia tratamento de água e esgoto.  

O último relatório de constatação do IBAMA, de 19/12, concluiu que houve negligência, falta de monitoramento sistemático, imprudência da equipe técnica e imperícia. Recomendaram a substituição da equipe por outra, com coordenadores e responsáveis técnicos com ampla experiência.

O PBA não foi cumprido

O resgate na ictiofauna ”visa evitar a mortandade de peixes que eventualmente fiquem aprisionados em trechos do rio que sofra redução ou interrupção da vazão”. Está expresso no PBA aprovado da usina de Santo Antônio, item 7, página 104.  Porém, há um dado ainda mais interessante no item 7.5, Metodologia: “De acordo com o projeto de construção da empresa o lançamento das ensecadeiras ocorrerá nos 2º e 3º anos [grifo meu].  Portanto, as equipes devem ser treinadas antecipadamente e ficar a postos para realização de resgates.” (...) “As ações de resgate previstas nesse documento durarão cerca de 10 dias. Nestas serão resgatados os peixes encalhados e/ou aprisionados em poças de água, bem como os indivíduos que se acumulam nos poços formados a jusante da barragem em função do aumento da velocidade da água durante o desvio do canal do rio, especialmente durante o período de piracema [defeso]”.

“As capturas deverão ser realizadas por uma equipe da usina treinada e acompanhada por profissionais de nível superior especializados em resgates de peixes e/ou com conhecimento na identificação de possíveis novas ocorrências de espécies ainda não inventariadas.”

Em que momento o lançamento das ensecadeiras [4 na margem direita] sofreu alteração no cronograma e acabou por coincidir com o “defeso”?
  
Além disso, não foram encontrados relatórios de monitoramento do  resgate da primeira fase, iniciado em  20 de outubro de 2008. Faltaram, também, os relatórios das vistorias do IBAMA nas obras das  ensecadeiras 2, 4 e 3 (do córrego Mato Grosso). 

Devido às informações insuficientes e contraditórias fornecidas pelo consórcio MESA e pela Dra. Carolina, no seu relatório ao Ibama, de 20/12 [depois dos eventos], seria importante conhecer os registros históricos detalhados das  ocorrências e os monitoramentos da primeira fase. Há evidências de que a mortandade de peixes nas obras das ensecadeiras da usina de Santo Antônio tenha sido muito maior que a demonstrada. 
Foto: Jota Gomes

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Dropes do dia

Grandes ONGs e algumas pequenas, também, estão dando aval à construção de PCHs como forma de gerar energia com menos impactos. O Greenpeace, no documento Cenário (r) evolução Energética,  defende como solução para substituir as usinas do Madeira e Belo Monte, a geração hídrica por PCHs....
Só que esqueceu de levar em consideração que as PCHs estão sendo utilizadas para beneficiar principalmente as empreiteiras e as indústrias de alumínio (auto-produtoras) que buscam terras baratas no interior de estados como Minas Gerais. Até o rio Tietê em São Paulo, não escapou e foi objeto de inventário. Aguarda a autorização da ANEEL para a construção de duas PCHs, justamente nas duas únicas corredeiras que servem para aerar as suas águas sem vida.
 As PCHs planejadas, que agora receberam o selo verde do Greenpeace, vão esquartejar  rios e, ainda, vender créditos no mercado de carbono. Como bem disse um respeitadíssmo professor e pesquisador do GTEnergia, “trata-se de uma catástrofe silenciosa, pois não há pernas suficientes para  denunciar os impactos sociais e ambientais daqueles projetos” (...) “as barragens não são uma revolução - são evolução, sim, de uma  política energética jurássica!” TM
Será que a Ministra da Casa Civil, Dilma Roussef, que é até madrinha de parque eólico no Rio Grande do Sul, não vai manifestar alguma sensibilidade e começar a defender o aproveitamento dos ventos brasileiros para gerar os tão sonhados megawats que o governo insiste que vamos precisar?...
 Para o setor elétrico e para o governo energia boa é aquela que vem do armazenamento de água ou das criminosas térmicas. No planejamento da expansão de energia para o horizonte 2017, a eólica participará com mísero 0,9%.
Pergunto: A geração eólica foi incluida no Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infra-Estrutura (Reidi), que reduz custos de grandes investimentos? Recentemente, foram incluídas nesse regime as hidrelétricas do rio Madeira, em Rondônia. Com o Reidi a empresa poderá contratar serviços, equipamentos e material a serem usados em obras do PAC com suspensão de dois tributos federais: PIS e COFINS.
Até as poluentes térmicas movidas a óleo, leiloadas recentemente, vão se beneficiar do Reidi! TM
O Banco Nacional de Desenvolvimento Social  (BNDES) vai ampliar sua participação nos financiamentos em empreendimentos de energia elétrica. De 60% passará para 80%....
O Tesouro Nacional já tinha repassado R$ 100 bilhões ao BNDES para tapar o buraco que a crise financeira global criou. As obras do Plano de Aceleração de Calamidades, precisam de dinheiro e como disse Dilma Roussef, ontem, o PAC era um “boizinho” magro que agora já está bem “gordinho”.  TM

Almoços de graça saem caros

ROBERTO SMERALDI
Falta de informação e equívocos caracterizam a consulta pública sobre o Plano Decenal de Energia, que vai até o final do mês

FALTA DE informação e equívocos caracterizam a consulta pública sobre o Plano Decenal de Energia, em andamento até o final do mês. Não se comparam opções alternativas e se compram promessas de lobistas, tanto na relação entre clima e energia quanto a respeito dos bolsos do consumidor e do contribuinte.
Apesar de o plano de energia ignorar o plano de clima, todos concordam que combustíveis fósseis são um problema: nem sequer o governo assume essa escolha. Pelo contrário, justifica o investimento em termoelétricas como uma alternativa, suja, mas inevitável, a partir do fato de que ambientalistas teriam impedido a construção de usinas hidroelétricas.
Mesmo sem saber quais seriam as usinas abortadas por causa de ambientalistas, a questão-chave é que tanto o governo quanto os que criticam o plano acabam repassando a mesma ideia, isto é, que hidroelétricas emitiriam menos carbono do que as termoelétricas.
Esse equívoco decorre do fato de que o Brasil possui parte de um milagre energético chamado Itaipu, a mais eficiente usina de grande escala do mundo. Devido a condições únicas de queda e localização, ela atinge menos de 0,6% das emissões de uma geração equivalente por térmicas. Além disso, possuímos outras duas usinas excepcionalmente eficientes, em Segredo (PR) e Xingó (SE), que emitem menos de 2% em relação a uma térmica. Juntas, geram quase um quinto de nossa eletricidade.
Esse padrão não tem parentesco com a realidade da Amazônia, onde temos quatro usinas, todas emitindo mais carbono do que as térmicas. É o próprio inventário oficial das emissões de gases de efeito estufa que confirma isso, embora calcule apenas uma parte das emissões, aquelas da superfície do reservatório.
Em três casos -Balbina (AM), Curuá-Una (PA) e Samuel (RO)-, a emissão atinge uma escala descomunal, muito superior à de uma usina a carvão que produzisse a mesma energia. No outro caso, o de Tucuruí (PA), as emissões do reservatório são equivalentes às de uma térmica a gás, e se considerarmos as emissões completas -incluindo as de turbinas, vertedouro, cimento e desmatamento dos entornos-, também passamos o padrão de uma usina a carvão.
Isso acontece porque, em regiões tropicais com muita biomassa -como é o caso da Amazônia-, há enorme emissão de metano, o gás de efeito estufa mais impactante. Os cientistas explicam isso comparando os lagos no meio da floresta a enormes garrafas de refrigerante recém-abertas.
É justamente na Amazônia que são planejadas as novas grandes hidroelétricas, nos rios Madeira, Xingu e Tapajós: trata-se de verdadeiras bombas, em termos de impacto sobre o clima, agravadas pela falta de governança nos arredores, que gera mais desmatamento.
Não se deve hostilizar a energia hidroelétrica em si, que jogou e pode jogar papel importante no desenvolvimento do país, mas não se pode confundir o termo renovável com carbono neutro. Não existe almoço de graça, como diria Milton Friedman: existem fontes com balanços mais favoráveis, como bagaço de cana, eólica ou solar, mas não há novas Itaipus.
Essa constatação leva ao ponto crucial do plano: em vez de um páreo entre lobistas para decidir quem é menos sujo -térmicas ou hidroelétricas na Amazônia?-, deveríamos focar a eficiência energética como opção de geração de emprego e de vantagem competitiva, rumo a um desenvolvimento duradouro e sólido.
A meta primordial do plano deveria ser a de reduzir drasticamente a energia que jogamos pelo ralo. De acordo com o TCU (Tribunal de Contas da União), ela passa (apenas na distribuição) dos 20% do total que produzimos, mais que o dobro da Argentina, quatro vezes mais que o Chile e sete vezes mais que a Alemanha. Joga-se fora o equivalente a todo o consumo dos Estados de Minas Gerais, Bahia, Ceará e Pernambuco.
O pior é que o TCU revela que esse desperdício é tolerado e não se tomam sequer medidas sem custo, de tipo meramente regulatório, para estimular as concessionárias a evitá-lo. O tribunal alerta que essa omissão é "determinante" das pressões para gerar mais energia, com altos custos, prazos maiores e mais vulnerabilidade frente a possíveis apagões.
O último relatório do TCU sobre o desperdício -de outubro do ano passado- nem sequer foi respondido por qualquer responsável. Se somarmos ao segmento da distribuição os da geração e do consumo, repararemos que nossa eficiência poderia quase dobrar, com um potencial de investimentos que supere a atual matriz baseada no desperdício.
O consumidor paga a conta da energia jogada fora e a economia global paga aquela da crise climática. 
ROBERTO SMERALDI , 48, jornalista, é diretor da Oscip Amigos da Terra - Amazônia Brasileira.
Folha de S. Paulo

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

A crise, o setor elétrico e o PDE 2008-2017: o que será na base do que é?

Luis Fernando Novoa Garzon*

A exponenciação da crise estrutural do capitalismo levará a uma postura agressiva preventiva da parte do núcleo do capital financeiro e transnacional, o que significa avançar sobre os estoques energéticos disponíveis. A queda acentuada dos preços dos insumos energéticos é apenas o intróito que propicia um desenrolar de reconcentrações brutais à custa dos países/empresas mais vulneráveis. Guerras são prorrogadas ou definidas pelo poder de deslocamento e fogo. Energia portanto serve para a guerra,  diretamente e por outros meios. No capitalismo, energia é força produtiva-destrutiva, remodeladora e direcionadora. O modelo energético reproduz de forma intensificada, a natureza concentradora e excludente do modelo econômico que impulsiona. Leia o artigo na íntegra no site do MAB

*Sociólogo, membro da ATTAC, da Rede Brasil sobre IFMs e da REBRIP
Professor da Universidade Federal de Rondônia


Ferrogrão – soja no coração da Amazônia

Estudo Preliminar 3 - Ferrogrão e a Soja na Amazônia                                                        Imagem: Brasil de Fato   ...